Paulo Freire

Paz & Terra Ltda, 50ª edição. 2015.

 143 Páginas 

Shirlei Santos Cardoso[1] 

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5518-5853 

 

Lídia Gomes de Macedo Messias[2]

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9748-2744 

 

Luiz Carlos Eufrasio Macedo[3]

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5180-4023 

 

Thamillys Mykaela Machado[4]

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2659-2791 



[1] Mestranda em Educação Profissional e Tecnológica- ProfEPT IFTM. E-mail: shirleicardoso3@gmail.com

[2] Mestranda em Educação Profissional e Tecnológica- ProfEPT IFTM. E-mail: lidiagdemme@gmail.com

[3] Mestrando em Educação Profissional e Tecnológica- ProfEPT IFTM. E-mail: luizcemacedo@gmail.com

[4] Mestranda em Educação Profissional e Tecnológica- ProfEPT IFTM. E-mail: thamillysmachado@hotmail.com


A obra Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa, de Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, pernambucano e pedagogo progressista, destarte, completa em 2021 seu centenário, o qual é motivo para comemorações. Sua obra foi originalmente escrita em 1996, contém 143 páginas em sua 50ª edição, com um milhão de exemplares vendidos, foi publicada pela editora Paz e Terra em 2015. A mesma apresenta um prefácio, primeiras palavras e três estudos, divididos em 3 capítulos. O prefácio postulado por Edna Castro de Oliveira e as primeiras palavras estruturam as ideias iniciais do autor. O primeiro capítulo intitula-se Prática Docente: Primeira Reflexão. O segundo, Ensinar não é Transferir Conhecimento. O terceiro, Ensinar é uma Especificidade Humana.  

No prefácio, Edna Castro de Oliveira discorre sobre a motivação em escrever sobre o livro do referido autor. Apesar da obra ser a última em vida, Paulo Freire não deixou de ser atual, inclusive no contexto dos saberes pedagógicos. Como declara Oliveira, o autor, é um homem de seu tempo e em seu modo lúdico e peculiar, de ser, reforça os estudos atuais das ciências da educação, as várias e crescentes fontes legítimas de saberes e a necessária coerência entre o “saber-fazer e o saber-ser pedagógicos”. 

Sendo assim, epistemologicamente, Freire retoma vários pontos de suas obras anteriores, focando o educando na prática educativa, propondo uma prática docente voltada para a autonomia de educadores e educandos na perspectiva de uma prática formadora como a inclusão do ser humano no processo do ensino-aprendizagem.

Em suas primeiras palavras que antecedem o primeiro capítulo do livro, Freire anuncia a obra resenhada, como um repúdio a essa ideologia que ainda em tempos atuais nos “nega e amesquinha como gente” e deixa claro sua concepção de ética universal, tão necessária a visão crítica e reflexiva nos saberes necessários à prática educativa, a qual o educador estabelece uma coerência na ação docente com seu ser, como indivíduo que não aceita o determinismo posto como opressão.

            No primeiro capítulo intitulado, Prática Docente: Primeira Reflexão, Paulo Freire ressalta a importância da troca de conhecimentos entre educador e educando, não apenas com conteúdos teóricos, ampliando ainda a relevância dos conhecimentos de mundo de cada sujeito. O docente possibilitará que nessa relação de ensino e aprendizagem aconteça uma conexão, na qual o docente permita ao educando assumir seu papel de criar e construir possibilidades para o seu saber.

Neste modo, a relação do ensino e aprendizagem, estrutura que o processo de formação do indivíduo, não deve existir separação entre sujeito e objeto, mas sim uma conexão, uma complementaridade tornando-se assim ambos agentes ativos no processo de aprendizagem, conforme evidencia Freire “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Quem ensina ensina alguma coisa a alguém” (2015, p. 25). Os seres humanos em suas raízes histórico-sociais tornam-se capazes de ensinar e aprender. Compete ao formador a possibilidade de despertar no aprendiz uma curiosidade crescente, que resultará na sua formação crítica.

Nesse sentido, a prática docente, na contextualidade atual, pressupõe por meio do autor, que educadores poderão buscar cursos de formação continuada, visando a melhoria e complementação de seus currículos, no entanto precisam permitir aos educandos que no seu processo de ensino-aprendizagem sejam autônomos, sob a égide de nossa inconclusão assumida, ou seja, quando ensinamos também aprendemos. Freire, propõe a reflexão para que haja respeito entre as partes, para que seja possível pensar diferente, questionar, indagar, discutir, pensar certo, pois só assim com uma reflexão crítica sobre a prática educativa, está cumprirá com seu papel, formar substantivamente.

 Do mesmo modo Paulo Freire salienta que “ [...] participamos de uma experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade (2015, p. 26 ), posteriormente, o autor  faz menção a formação completa do ser humano, levando em consideração as composições de ensinar, no qual, há a interação entre o ensino e educação, sendo que um não existe sem o outro, e ao mesmo tempo, exige diálogo e respeito pelo educando e sua concepção de mundo, processo de importante contribuição em sua obra.

 Freire destaca que o docente não deve ser mero repetidor de conteúdo, porque caso ocorra, este estará limitando a formação dos aprendizes. Então, ensinar, neste sentido não esgota no “tratamento” do objeto ou conteúdo, superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que aprender criticamente é possível.

O ato de educar exige pesquisa, ambos são indissolúveis, pois no momento em que o docente pesquisa, ele aprende, e aprendendo depara-se com a dialética do processo. A escola progressista a qual o autor se refere, precisa ser resgatada, o modelo de formação da contemporaneidade tem dado ênfase na quantificação e massificação dos alunos, são muitas as reformas no âmbito educacional, as quais nem sempre vêm sendo realizadas, visando melhorias no processo de ensino e aprendizagem.

No capítulo dois Paulo Freire inicia considerando que, “ensinar não é transferir conhecimento”, ou seja, a formação docente necessita pautar em conceitos que reconheçam o aluno como ser que indaga, que tem curiosidade e neste sentido levar o educando a pensar como ser crítico, assim deixar as inibições, fato que fará com que o professor reveja princípios com base em uma educação progressista, valorizando o cotidiano, a cultura, o meio e a vivência do aluno em sociedade, criando possibilidades para a construção e produção de sua prática pedagógica, a qual Freire enfatiza, “ensinar e não transferir conhecimento”, sendo esta uma necessidade à formação do docente, porque quando ensinamos para além da teoria, é preciso executar nossa prática, leituras e ensinamentos. 

Assim, quando o docente deixa de “enxergar” o discente em sua totalidade, em sua cultura, em seu cotidiano, ele está inibindo a presença deste em seu contexto social, cultural e político. Postulando sua linha de pensamento crítica, Paulo Freire ressalta a importância, enquanto docente crítico, ao conhecimento do novo e inacabado e como seres que somos, culturais, históricos e “conscientes do inacabamento”, não repetir nossa experiências e sim transformar, criar e recriar, por isso ensinar nos permite ver que sempre estaremos em construção na prática de ensinar. 

Paralelo a essa contextualização de sujeitos inacabados, tornamo-nos seres condicionados, portanto, não podemos nos prender ao condicionamento e como seres inconclusos, podemos superar as barreiras das condições materiais, econômicas, sociais, políticas, culturais e ideológicas em que nos encontramos conforme cita Paulo Freire. No entanto, quando pensamos e agimos com cautela e bom senso, demonstramos solidariedade, dignidade e respeito ao educando, isto é, respeitando o conhecimento e particularidade de cada sujeito, dando sentido às novas práticas, seguindo a ética e a estética, e assumindo sua identidade, cultura e o pensamento crítico, sobre “[...] democracia e liberdade mas impor ao educando a vontade arrogante do mestre” (2015, p. 61).

Acresce que, nos saberes inerentes a prática do docente, Freire aponta que a tolerância e a luta em defesa dos direitos dos educadores, são imprescindíveis para descartamos o que vivenciamos até hoje, a falta de valorização da classe dos professores e o descaso com a educação pública, visto que, sempre presenciamos greves, paralisações, movimentos sociais em prol de uma educação de qualidade, valorização dos educadores em receber “salários justos”, podendo investir mais em sua formação. Porém, segundo Paulo Freire que seja uma luta com base política consciente, crítica e organizada. 

Freire pontua a questão subjacente à alegria e a esperança em nossa prática pedagógica, na relação com nossos educandos, mesmo com as dificuldades, injustiças, fome e pobreza existentes em uma sociedade a qual os mais necessitados não são acolhidos, sejam crianças, jovens ou adultos, a amorosidade faz se necessária nos saberes imprescindíveis à prática educativa. 

Justamente por conta deste cenário Paulo Freire enfatiza que ensinar exige a convicção de que a mudança é possível, em meio a tanta pobreza, como cita “Ninguém pode estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra” (2015, p. 75), parte de nós essa mudança, a acomodação não pode fazer parte da prática, da ação pedagógica do professor. 

Outrossim, o autor observa que a estrutura da Educação pressupõe algumas questões de suma importância, nesse sentido, Freire aponta: “Em favor de que estudo? Em favor de quem? Contra que estudo? Contra quem estudo?” (2015, p. 75). Afinal, hoje vivemos em uma sociedade a qual visualizamos ainda a discriminação, a violência contra os mais fracos, a educação desigual e desumana para aqueles com necessidades específicas, a miséria de muitos povos e regiões que nem sequer tem condições dignas de moradia, quanto mais de educação. 

E nesse sentido, no último capítulo do livro “Ensinar é uma especificidade humana”, Paulo Freire nos apresenta qualidades essenciais e saberes inerentes a uma docência democrática e libertadora, visando educar os alunos com pensamento criativo, crítico, libertador, autônomo, capaz de entender a realidade em que está inserido, e dialogar as relações vivenciadas nos diversos ambientes. Desta forma, o autor pontua qualidades essenciais para a autoridade docente democrática, como a segurança em si mesma, em relação a liberdade com os alunos, expressa por sua postura, firmeza na atuação, decisão, respeito aos educandos, a maneira como discute seus posicionamentos. Em consequência a competência profissional, em que é preciso que o professor tenha comprometimento, valorize o conhecimento adquirido (sua formação), busque estar atualizado, para que tenha engajamento efetivo em suas atividades em sala de aula, pois, pode ocorrer da falta de força moral para coordená-las, gerando assim a desqualificação de sua autoridade. 

Outra qualidade imprescindível é a generosidade nas relações, na abertura da liberdade para com os educandos, pautada no pensar crítico, na dúvida instigadora, na esperança que desperta, na inquietude. Eles que exercitam sua liberdade, ficarão mais livres, e quanto mais éticos vão assumindo responsabilidades em suas ações, e criando sua autonomia. Aliado a estas qualidades, o comprometimento é bastante observado por parte dos alunos de variadas maneiras, e essa observação se torna importante para o desempenho do professor. O autor concentra-se em um fator relevante entre o falar e praticar, sendo necessário aproximar a conduta do magistério com estes elementos e suas atitudes, pois, não passam despercebidos pelos alunos.

Além disso, a liberdade e a autoridade nos trazem a reflexão de como ter equilíbrio de forma democrática entre estes saberes, onde se faz necessário o limite de forma ética assumida pela liberdade. A autoridade é oportuna para que haja respeito do educando para seu educador, não no sentido autoritário, mas na demonstração de ações que não são positivas para a prática pedagógica de forma geral. A liberdade amadurece à medida que outras liberdades e outras escolhas vão sendo tomadas, gerando a partir de suas decisões consequências que exigem responsabilidade e pensamento crítico. Deste modo, a autonomia se constitui quando as experiências e decisões vão sendo vivenciadas, é um processo de amadurecimento. 

Outro saber pontuado é a escuta, que nos transmite a relevância de se ter uma escuta ativa do educador para com seu educando, em que o espaço do educador democrático progressista aprende a falar escutando, participando, tendo respeito e interação entre as partes. Ao contrário do autoritário, que se comporta como dono da verdade, “senhor (a) do tempo". Este saber escutar percorre ao querer bem o educando, a entender suas dificuldades, suas angústias, seus medos, compreender as situações que se encontram. Salienta-se ainda, que o respeito da leitura de mundo de cada aluno é o ponto de partida a ser compreendido na construção da produção do conhecimento gerado, e dentro deste contexto de progressismo pedagógico são necessários a amorosidade, o respeito, tolerância, humildade, gosto pela alegria, pela vida, abertura à justiça, dentre outros.

Por conseguinte, Freire traz o saber do reconhecimento da ideologia que nos permite advertir sobre armadilhas que muitas vezes não enxergamos. Ele deixa claro ser defensor dos interesses humanos, respeitando a realidade e liberdade individual de cada um, e buscando o pensar crítico e não mais passivo de seus educandos. Fica evidente que a ideologia tem um papel persuasivo, que pode confundir e distorcer nossas percepções nas quais estamos envolvidos. É necessário que tenhamos reação crítica, ao ouvirmos discursos ideológicos relacionados a preconceito, discriminação, religião, política, de ódio, social, dentre outros.

Freire condenou as ideias fatalistas pelas quais a imobilidade ideológica é aceita, de que a realidade é o que é e o que podemos fazer a respeito, ponderando sobre a capacidade do educador de tomar decisões que transformam a realidade dos alunos de preceitos desesperançados em esperançosos, cheios de possibilidades. A abordagem da educação designa-se de abordagens diretas com os processos dos indivíduos a caminho de sua libertação pessoal.

Enfim, é preciso ter respeito, disponibilidade para o diálogo e querer bem aos educandos, construindo a partir disto um processo de comunicação segurança, cooperação, de afeto, de abertura para o novo, para o entendimento, para a superação do pensamento renegado e excludente, abrindo-se para o mundo um olhar de criticidade e entendimento do seu papel como sujeito ativo.

Por tudo isso, o livro é recomendado a todos que buscam entender o papel da educação como agente de libertação dos véus da ilusão em que estamos inseridos, propondo não só o educador como papel relevante no processo, mas o educando como figura de mudança em si mesmo e para o ambiente em que esteja inserido. Busca levar a reflexão de pensarmos além, de forma crítica a partir do diálogo, a liberdade, a generosidade, a autonomia e a luta pelos direitos humanos como ferramentas potenciais para a maturação do indivíduo. 


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática Educativa. 50ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.