Marisa Lajolo e Regina Zilberman

Editora Ática S.A, 2.ed. 1985.

190 páginas

Izabela Secco[1]

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9623-4535

 

Marciele Marchesan [2]

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7676-4179



[1] Graduada em Pedagogia e Mestranda em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT. E-mail: izabela.secco@unemat.br

[2]Mestre em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT. E-mail: marciele_marchesan@hotmail.com


Ao que hoje parece um gênero literário consolidado, tão comum e presente ao nosso cotidiano, não poderia passar despercebido ao nosso olhar todo o trajeto percorrido desde os primórdios até então. Se a literatura infantil por si só, precisou sacramentar seu surgimento em meio a transformações sociais e culturais efervescentes que floresciam diante dos séculos XVIII e XIX, em uma metamorfose que transformou enredos que até então eram nada infantis em formatos palatáveis ao seu público alvo, posteriormente solidificados em clássicos do gênero.

Em reflexo deste histórico percalço europeu, não seria diferente que em terras tupiniquins reescrevêssemos tal história com elementos pertinentes à brasileira, com todas as peculiaridades às quais a própria história se encarrega de explicar ao logo deste texto de Lajolo e Zilberman. Compreender a história por trás de nossas histórias infantis é perceber como um gênero literário também pode passar por suas fazes transitórias até sair de um período pueril até alcançar sua própria maturidade, e é sobre isso que as autoras discorrem em Literatura infantil brasileira: história e histórias.

Ao logo de seus sete capítulos, o livro discorre sobre contextos históricos e fatos relevantes que foram cruciais ao surgimento do gênero na Europa, culminando em sua chegada em terras brasileiras, amadurecendo suas produções que outrora eram tão somente importações lusitanas, reproduções de obras europeias ou traduções sem qualquer sutileza quantos as especificidades da cultura local.

No capítulo inicial, as autoras discorrem quanto a importância de se conhecer a história deste gênero tão relevante, exercitando reflexões quanto a literatura infantil brasileira. Evidencia-se como este gênero sedimenta um segmento economicamente relevante até então inédito em nosso país, fenômeno catapultado pela explosão de produção e consumo de obras infantis observado a partir da década de setenta.

Em uma síntese dos capítulos que se seguem, Lajolo e Zilberman conjecturam sobre aspectos que envolvem o gênero como a questão cultural brasileira, a identidade das produções literárias ao logo dos últimos cem anos no país, contrapontos da literatura infantil e não-infantil, além da natureza da produção simbólica dos textos construídos até então.

Valendo-se de uma abordagem que não poupou esforços em evidenciar todo o amadurecimento da produção literária infantil no Brasil, desde o desembarque de obras oriundas do outro lado do atlântico, até a construção de uma identidade própria já em pleno século XX.

No segundo capítulo, há de fato um aprofundamento quanto as primeiras obras consideradas infantis no mundo, mais especificamente na Europa, para então discorrer sobre o desenvolvimento deste gênero no país, contextualizando surgimento e produção a partir do século XIX.

As primeiras publicações voltadas ao público infantil surgiram na primeira metade do século XVIII, antes disso, no classicismo francês do século XVII foram produzidos textos que poderiam ser descritos como então apropriados as crianças como as Fábulas de La Fontaine, obras de Fénelon e Charles Perrault, considerado o responsável pelo surgimento de fato da literatura infantil ao materializar histórias até então de origem popular em produções literárias voltadas aos pequenos.

Já no terceiro capítulo, “Na república Velha, a formação de um gênero novo”, marcando o ponto de chegada da família real ao Brasil ainda em 1808, como marco para a chegada das primeiras obras infantis ao país, com a importação de obras e implantação da imprensa régia, que passa a realizar a tradução e publicação de obras como “As aventuras pasmosas do Barão de Munkausen e, em 1818” e seguindo-se com demais publicações esporádicas e circunstanciais ao longo dos anos posteriores.

Ao final da monarquia e instituição da república, as autoras relatam como de forma tardia, a industrialização que foi a mola propulsora para comercialização de obras infantis na Europa, no Brasil é compensada pela efervescência cultural que surge com o novo regime, bem como pela mudança da mão de obra de base com a tardia abolição da escravidão e pela afirmação da monocultura de café como trampolim econômico para promover mudanças nos contextos finais do século XIX e início do século XX.

Em contraponto a “Belle Époque” europeia, a era dourada brasileira é descrita sob o virtuosismo do parnasiano Olavo Bilac, as representações literárias dos simbolistas, da transição pré-modernista de Euclides da Cunha ao regionalismo de Monteiro Lobato, como descrito, em meio a eclosão de uma urbanização e modernização que não equacionou as singularidades de uma multidão recém liberta que era empurrada de dentro para fora rumo as extremidades metropolitanas.

Sob a pujante obsessão pela produção nacional literária voltada infância, inicialmente catapultada sob a tutela do sistema escolar que pretendia-se modernizar, implantar e difundir em meio as demais mudanças que o novo século apresentava, desta vez, sobretudo, arraigada de forme sentimento regional nacionalista patriótico personificado por figuras do quilate de Olavo Bilac.

Ainda nesse período, descreve-se que não apenas a tradução de obras importadas da Europa eram moldadas ao publico brasileiro, mas também todo um modelo de “patriotização” infantil velada sob conceitos de honra, moralidade, superação e valorização do seio familiar, tal qual Através do Brasil de Bilac, Contos pátrios em parceria com Coelho Neto e Histórias da nossa terra de Júlia Lopes Almeida, configurando verdadeiros clássicos paradidáticos, ressaltando ainda a conversão de significância da palavra “terra” outrora relacionada tão somente a natureza e agora revestida sob a face de pertencimento patriótico.

Há de se ressaltar ainda um evidente anseio pelo melhor emprego do português praticado em solo brasileiro, como mais uma fase de amadurecimento das obras infantis nacionais, que enquanto meras importações oriundas de terras lusitanas, impunham específicos empecilhos para compreensão de determinados termos cujos quais nada se assemelhavam com as percepções linguísticas culturais praticadas em solo tupiniquim, adjetivada pelas autoras como “obsessão pela vernaculidade”.

Sob a veste de um perfeccionismo com o emprego da língua portuguesa em sua forma culta, observou-se até mesmo a inversão de características linguísticas de personagens tidos como populares, impedindo representações linguísticas “realistas” em falas de personas infantis ou que não apresentassem escolarização para tais expressões, procurando assumir desta forma uma vanguarda missionária de cunho pedagógico em busca de entregar ao público infantil uma linguagem considerada “apropriada” e que se distanciasse contraditoriamente ao que o parnasianismo propagava, mas estritamente condizente de seu preciosismo literário acadêmico.

Em seus três primeiros capítulos, Lajolo e Zilberman abrem caminho em busca das raízes históricas da constituição e afirmação da literatura infantil no Brasil, primeiro explicitando o surgimento da literatura infantil em si, ainda em solo europeu, desvencilhando-se das produções literárias então existentes, para só então solidificar como gênero literário independente e reconhecido.

Esse processo transitório entre as histórias populares que permeavam as rodas de conversa que persistiam gerações após gerações, muitas nada infantis, repletas de elementos um tanto quanto inapropriados para tal, mas que sob a perspectiva dos pioneiros deste gênero foram delineadas e moldadas para transformarem-se em clássicos infantis atemporais.

Ao adentrar para o quarto capítulo, intitulando-o como “de braços dados com a modernização”, é eleva Monteiro Lobato ao seu lugar de direito, não apenas como brilhante escritor, mas também como visionário, sendo responsável ao mesmo tempo por transcrever uma realidade rural verossímil ao que de fato era em suas obras infantis, como também grande empresário e semeador editorial, em época na qual poucas eram as editoras disponível e em sua maioria, apenas tentativas de reproduzir modelos advindos da Europa.

Ao transcrever as obras de Lobato, em sucessão as diversas obras então quase que solitariamente produzidas, observa-se segundo as autoras, a eclosão de diversos novos escritores de literatura infantil. A revolução de 30 e o movimento da Escola Nova também ganham espaço de destaque em todo esse processo de amadurecimento, principalmente no que tange a necessidade de instruir uma leva de novos trabalhadores capitaneados por um êxodo rural proporcionados pelas mudanças econômicas e politico sociais que ocorriam no período.

Ainda sob o manto do “nacionalismo”, o proposito de modernização proposto pelos intelectuais da época, é evidenciado por Lajolo e Zilberman como necessário e mesmo que vigência de um regime não democrático fosse o pano de fundo desta obra, ao mesmo tempo em que a essa conexão era repelida, também era necessária para que se pudesse aplicar as mudanças almejadas na base de ensino, que consequentemente passava pela profusão da literatura infantil como instrumento didático cultural.

A dissidência de Lobato em representar o universo bucólico em suas obras infantis, fugindo dos exemplos observados em sua época, fazendo uso do ruralismo como ambiente essencial aos seus enredos, transcrevendo um caráter realista ao conceber suas criações, tal qual também eram os cenários das histórias infantis do velho continente, oriundas da cultura popular e do folclore europeu. 

Sobra espaço ainda para um confrontamento entre o protagonismo interposto às crianças nas obras de Erico Veríssimo e Menotti del Picchia, na qual os pequenos quase sempre necessitam de um adulto para desenrolar suas aventuras no mundo da fantasia, em oposição ao praticado por Graciliano Ramos e Lúcia Miguel Pereira, na qual são as próprias crianças que exploram as possibilidades da imaginação ao desenvolverem seus enredos.

Há marcos relevantes que foram muito bem observados pelas autoras, ao compreender a transição entre a matriz europeia até a total imersão no folclore brasileiro, lembrando ainda Macunaíma de Oswald de Andrade e Martim Cererê de Cassiano Ricardo, sem deixar é claro de mais uma vez explicitar a indissociável relação entre a literatura infantil e o universo escolar, citando a educação como um instrumento de ascensão social e a literatura como instrumento de difusão para tal.

Em seu capitulo quinto, Lajolo e Zilberman traçam paralelos ao que chamam de “dois brasis”, demonstrando claramente que ao despertar da década de 40, ainda que agora houvessem substanciais produções literárias se comparado ao que se observara décadas atrás, entretanto a qualidade não estava associada a quantidade, citando o enorme volume de produções traduzidas e de baixa qualidade editorial.

Se, todavia, a qualidade não era a esperada, as autoras ressaltam que neste momento a produção literária infantil era agora vista não apenas como artigo raro entre as produções literárias nacionais, mas sim como um grande marcado em ampla expansão, sendo agora necessário não mais conquistar espaço, mas sim reafirmar a importância conquistada. O período que abrange as décadas de 1940 à 1960 é definido pelas mesmas como uma fase de profissionalização e especialização.

A geração de 45 e seus ideais opostos ao Modernismo não ficaram de fora das evidenciações históricas levantadas, especialmente citados nas obras de estreia de Clarice Lispector, com Perto do coração selvagem, no ano de 1944 e Guimarães Rosa com Sagarana em 1946, dando início ao que denominam como “processo de renovação da prosa regionalista”.

Antes do capitulo derradeiro, faz-se ainda menção a infantilização da infância e também a sua tematização, por meio de artifícios literários, seja pela focalização literal da criança ou por sua simbolização através de personagens não humanos. Esse movimento é roteirizado pela iniciativa de Figueiredo Pimentel e tem continuidade com Monteiro Lobato, Viriato Correia e Érico Veríssimo.

É pertinente verificar que dentre varias obras citadas que conotam a objetos então inanimados, características, movimentos e atitudes humanas, como em Bumba, o boneco que quis virar gente (1955) de Jerônymo Monteiro ou O bonequinho de massa, (1941) de Mary Buarque, a independência da Emilia de Monteiro Lobato é considerada inigualável.

Em um período seguinte, no qual as produções retomam o perfil moral e idealizador, no qual mesmo dirigidas as crianças, procuravam condicioná-las a uma projeção ideal de obediência e dependência aos adultos, as autoras apontam que obras reconhecidas pelo sucesso crítico, não conseguiram atingir o sucesso de público, ainda assim perduravam comercialmente, fato esse que aparentemente remete a uma reflexão proposta por Lajolo e Zilberman, ao sugerirem inclusive uma “sociologia da leitura” ainda por constituir-se ante aos filtros do mercado literário, nem sempre de mãos dadas com a qualidade do que se propõe oferecer.

As constantes transformações econômicas e sociais do período, são reafirmadas como propulsoras para o crescimento industrial e urbano e consequentemente cultural da sociedade brasileira no período. Frente a esse fato, a literatura infantil foi favorecida pois a indústria do livro procurou preencher as necessidades de mercado impostas pela escolarização idealizada para aquele momento vivido pelo país. Ainda assim, as autoras demonstram o tom de crítica ao relatar como a produção literária infantil à época, passou a “fabricar” obras de acordo com as exigências do mercado, que na verdade, não eram necessariamente as mesmas do consumidor final, o público infantil.

Em seu ultimo terço, ao apontar para seu capitulo final, Lajolo e Zilberman desembarcam no florescer dos anos 60, citando ainda os inúmeros programas de incentivo a leitura e ao livro, como a Fundação do Livro Escolar (1966) e Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (1968), entre outros. Políticas nacionais de incentivo a produção literária infantil são implementadas e de acordo com as autoras, figuras consagradas da literatura nacional são também seduzidas a se enveredar pela literatura infantil, como Mário Quintana, Cecília Meireles, Vinicius de Morais e Clarice Lispector.

Esse movimento apontado e verificado pela expressiva produção literária infantil, acompanha de fato as mudanças e necessidades comerciais pretendidas pelas editoras, em um cenário econômico que favoreceu a modernização, padronização, frequência e regularidade das publicações infantis entregues ao público.

Se outrora o universo rural fora dominante dentre os cenários escolhidos para constituir o enredo das histórias infantis, as décadas de 70 e 80 são permeadas de produções que evidenciam o ambiente urbano, sua desigualdade e conflitos pertinentes a realidade nada similar ao idealizado, bem como a abordagem de temos considerados como tabus ou impróprios para a sociedade até então.

A industrialização da cultura é apontada pelas autoras como responsável pela diversificação de temas e gêneros, além da popularização de ficções científicas e mistérios policiais voltados, os quais O gênio do crime, de João Carlos Marinho, e A vaca voadora, de Edy Lima, entre muitos outros citados ao longo do texto.

Este momento da produção literária infantil é evidenciado ainda como um divisor de águas quanto ao aspecto gráfico dos elementos do livro, agora não mais utilizados apenas como elementos de apoio, mas parte transversal da obra, muitas vezes ocupando importância central na obra, assumindo o papel de conferir significado ao próprio texto e não mais o contrário, como em Chapeuzinho Amarelo (1979), de Chico Buarque e O menino maluquinho (1980), de Ziraldo.

São ainda percebidos a transposição de poesia e de elementos que renegam a representação do realismo, corroborando com a percepção de que de fato a literatura infantil alcançara uma independência até então inédita para o gênero.

A marca dessa mudança é descrevida como um abando a tradição didática do livro infantil, a poesia infantil praticada por escritores de renome como Sidônio Muralha, Cecília Meireles e Vinicius de Morais é apontada como norte ao desprendimento com o tom didático envolto aos princípios de propagação dos valores tradicionais, ainda verificando-se que um movimento disruptivo com os resquícios parnasianos ainda presente até a década de 60.

Por fim, ao apresentarem as décadas de 60 e 70 como de entrada do país ao um modelo capitalista mais avançado, segundo palavras das autoras, verificou-se também um aprimoramento de instituições de execução das ditas politicas culturais do estado, período no qual não vivíamos mais em democracia, entretanto os avanços necessários para implementação, produção e consumo de não apenas da literatura convencional, bem como a literatura infantil, permitiram um amadurecimento inevitável e indomável, uma história repleta de histórias.

A obra de Lajolo e Zilberman se propõe a descrever a trajetória desde a chegada ao amadurecimento do gênero literário infantil em solo nacional, contextualizando cenários observados entre a Europa e o Brasil, abordando acontecimentos históricos e socioculturais de forma a possibilitar um melhor entendimento quanto as similaridades e singularidades do processo de gênese da literatura infantil sob tais aspectos.

O texto é articulado, flutua entre publicações aclamadas deste período e fatores históricos de maneira clara, explicitando como o surgimento e evolução deste nicho editorial tem sua história entrelaçada com a própria história de nosso país, hoje fim de determinados meios, hora como meio para determinados fins, delineando uma sequência de fácil compreensão ao leitor.

Ainda que o texto original date de meados dos anos 80 e suas posteriores reedições tenham mantido a mesma estrutura, percebe-se que a pretensão em documentar a história da literatura infantil brasileira foi objetiva, atual e eficiente em sua meta, produzindo uma obra transcendental que consegue preencher bem os espaços temporais que constituem essa jornada.

É um livro bem organizado, seus sete capítulos estão dispostos de forma coerente, sendo complementares e seguindo uma cronologia que descreve bem como a literatura infantil constitui-se em etapas distintas em solo brasileiro, primeiro sob a sobra da implantação da imprensa no país com a chegada da família real ao Brasil, posteriormente como ferramenta paradidática até alcançar status de valorização comercial com a explosão editorial setentista.

Marisa Philbert Lajolo, nascida em São Paulo, no ano de 1944, cresceu na cidade de Santos, considerando-se praiana. Ensaísta, pesquisadora, crítica literária, escritora de literatura juvenil e professora universitária; formada em Letras pela Universidade de São Paulo, onde também fez mestrado e doutorado, neste último já discorrendo em sua tese no ano de 1979 sobre “Usos e abusos da literatura na escola (Bilac e a literatura escolar na República Velha)”, tal qual também descreve o capitulo terceiro do livro ao qual este manuscrito se refere, concluiu pós-doutorado pela na Brown University.

Regina Zilberman, natural de Porto Alegre, nascida em 1948, pesquisadora, escritora, ensaísta, graduada em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1970), doutorou-se em Romanística pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha, e fez pós-doutorado em Rhode Island, nos EUA, atualmente professora da PUC/RS, especialista em literatura infantil, já abordara este tema em obras como Literatura infantil na escola, pela editora Global em 1981, A leitura em crise na escola: as alternativas do professor, de 1982 e Literatura infantil: autoritarismo e emancipação, pela editora Ática, também de 1982.

As notas de rodapé encontradas em História e Histórias, nestes capítulos iniciais, vão de O pensamento Selvagem de Claude Lévi-Strauss, percorrendo menções a Toda Poesia de Ferreira Gullar, transitando pelo poema Infância de Carlos Drummond de Andrade a Contrabando de Oswald de Andrade, sem deixar de citar Bilac e Coelho Neto, além de Manuel Bonfim em Contos Pátrios e Através do Brasil, respectivamente.

É uma obra necessária, atemporal e constante. Ainda que em determinados momentos haja a insistência em remeter a fatos históricos já visitados em passagens do livro, não deixa de seguir uma linha histórica que fornece subsídios para que possamos compreender o desenvolvimento da literatura infantil brasileira. Uma única ressalva ao fato do escritor paulista, Jerônymo Monteiro, considerado pioneiro da ficção científica brasileira, ser citado 22 duas vezes na obra, em todas com seu nome grafado de acordo com o emprego moderno, Jerônimo, em substituição ao nome de batismo, tal qual historicamente utilizado nas capas de seus livros.

Lajolo e Zilberman, impreterivelmente além de literalmente contar a história da literatura infantil brasileira, não deixaram de mencionar seus personagens mais relevantes dentro da construção dessa trajetória, cheia de nuances e detalhes capazes de transformar fantasia em uma realidade pujante e profícua, não apenas para os pequenos leitores, mas todos aqueles que compreendem a necessidade e importância da literatura infantil, ainda mais em um país como o Brasil, onde a leitura e os livros andam tão desprestigiadas.

Se durante esse percurso histórico, não apenas a literatura infantil, mas também a literatura como um todo, precisou se reinventar e atravessar períodos turbulentos e nebulosos, muitas vezes sendo instrumento de politias econômicas e sociais vigentes, talvez conhecer a histórica em seus mínimos detalhes tal qual propiciado nesta obra, nos faça mudar a percepção interposta por alguns em nossa época, que assombrosamente referem-se aos livros sutilmente como amontoado de palavras.

Literatura infantil brasileira: história e histórias, cumpre bem o seu papel de retratar a construção do gênero literário infantil em nosso país. É uma obra prestes a completar quatro décadas desde a sua primeira edição, entretanto enquanto procurava explicitar todos os percalços desta trajetória até então, conseguiu tornar-se um marco histórico tal qual a própria história que buscava representar. 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil brasileira: História e Histórias. São Paulo: Série Fundamentos, Editora Ática S.A, 2.ed, 1985, 190 p.