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Rayan Silva de Paula

Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (2014). Mestre em Biologia Celular pela UFMG (2018). Doutorado em andamento em Biologia Celular pela UFMG – rayansdpaula@gmail.com

 

Júlia Meireles Nogueira

Bacharela em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (2016). Mestre em Genética pela UFMG (2018). Doutorado em andamento em Genética pela UFMG - jumeirelesn@gmail.com

 

Alinne do Carmo Costa

Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (2016). Mestre em Biologia Celular pela UFMG (2018). Doutorado em andamento em Biologia Celular pela UFMG - alinnecarmocosta@gmail.com

 

Aline Gonçalves Lio Copola

Bacharela em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (2013). Mestre em Biologia Celular pela UFMG (2016). Doutorado em andamento em Biologia Celular pela UFMG - aline.copola@gmail.com

 

Erika Cristina Jorge

Doutora em Ciência Animal e Pastagens pela Universidade de São Paulo (2006). Pós-doutora pela Harvard University (2015). Professora do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Minas Gerais - erika.cris.jorge@gmail.com

 

Walderez Ornelas Dutra

Doutora em Bioquímica e Imunologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (1995). Pós-doutora pela Stanford University (2007). Professora do Departamento de Morfologia da UFMG - waldutra@gmail.com

 

Resumo: Existe um distanciamento entre a forma como a ciência é concebida nos mais diversificados laboratórios de pesquisa e como esse conhecimento é disponibilizado para a sociedade, especialmente em aulas práticas laboratoriais de ensino básico. No ambiente escolar existe a concepção de que um aumento do número de aulas práticas contribuiria substancialmente para maior apropriação do conhecimento e dos produtos disponibilizados pela ciência. No entanto, nem sempre a metodologia ativa nesse contexto é garantia de um significativo aprendizado das bases que norteiam a produção científica por parte dos estudantes. A inserção do conhecimento científico no ambiente escolar poderia ser facilitada, promovendo a reflexão da realidade da produção científica, pelo intermédio de parcerias entre a universidade e as escolas, por meio de projetos de extensão, como evidenciado neste trabalho com o Projeto “Curious Minds”, que liberou acesso às dependências físicas de laboratórios da universidade para alunos de ensino médio. Os resultados gerados por esses projetos geram ganhos não somente paras instituições envolvidas, mas para os estudantes e toda a comunidade e sociedade que permeiam o ambiente escolar, bem como para os alunos de pós-graduação, responsáveis em grande parte pela produção do conhecimento científico nos moldes como são produzidos na atualidade.

Palavras-chave: ensino-aprendizagem de ciências, parceria universidade-escola, extensão universitária, aulas práticas, laboratórios

Abstract: There is a gap between the way science is conceived in the most diverse research laboratories and how this knowledge is made available to society, especially in practical laboratory classes in basic education. In the school environment there is a conception that an increase in the number of practical classes would contribute substantially to greater appropriation of knowledge and products made available by science. However, the active methodology in this context is not always a guarantee of a significant learning of the bases that guide the scientific production by the students. The insertion of scientific knowledge in the school environment could be facilitated, promoting reflection on the reality of scientific production, through partnerships between the university and schools, through extension projects, as evidenced in this work with the “Curious Minds” Project , which released access to the physical facilities of the university's laboratories for high school students. The results generated by these projects generate gains not only for the institutions involved, but for students and the entire community and society that permeate the school environment, as well as for graduate students, responsible in large part for the production of scientific knowledge in molds as they are produced today.

Keywords: science teaching-learning, university-school partnership, university extension, practical classes, laboratories.


O contexto geral

            Existem muitos debates acerca da qualidade de ensino provido pelas escolas e quais as metodologias tornam-se assertivas no processo de ensino-aprendizagem. As discussões em torno dessa qualidade são recorrentes ao longo dos anos e tem sido alvo de discussões, culminando em proposição de reformas não apenas para os currículos vigentes, mas também para o sistema educacional como um todo. No entanto, a escola não tem conseguido desenvolver em seus alunos uma formação crítica e autônoma, que são características imprescindíveis em tomadas de decisão e que é tão desejada pela sociedade. De acordo com Borges (2002, p. 10):

A escola tem sido criticada pela baixa qualidade de seu ensino, por sua incapacidade em preparar os estudantes para ingressar no mercado de trabalho ou na universidade, por não cumprir adequadamente seu papel de formação das crianças e adolescentes, e pelo fato de que o conhecimento que os estudantes exibem ao deixar a escola é fragmentado e de aplicação limitada (Borges, 2002, p. 10).

            A melhora da qualidade de ensino pauta-se somente no plano retórico das ações governamentais. Medidas como a introdução e criação de novas disciplinas, aumento da carga horária dos professores e programas de avaliação de livro didáticos foram implementados ao longo dos últimos anos, enquanto questões urgentes (e igualmente importantes) como a valorização dos espaços educacionais e da capacitação e aperfeiçoamento dos professores continuam sendo postergadas (SANT'ANA, 2005). Faz-se necessário que o processo de ensino-aprendizagem acompanhe os avanços da sociedade, sobretudo os tecnológicos, área em que o volume de informações gerado a cada minuto é enorme e este é o ambiente onde o aluno encontra-se cada vez imerso. Devido à mudança acelerada dos contextos sociais atuais é inevitável que o ambiente escolar sofra pressões profundas e permanentes, o que vem tornando as instituições escolares lugares de importantes contradições, estando o professor no centro destas (VIEIRA, 2008).

            A busca e aplicação de metodologias complementares a aula expositiva tradicional (que também possui valor agregado e que não deve ser totalmente descartada), ficam a cargo do professor. No entanto, a escolha de metodologias alternativas viáveis associadas ao contexto real, no qual se inserem os professores, os alunos e a escola, torna-se um grande desafio. A escolha de determinada metodologia, em qualquer prática educativa, deve, portanto, visar o tipo de formação desejada para o sujeito, dentro de seu contexto histórico (RAYS, 1996). Considera-se ainda que esse desafio enfrentado pelos professores é ampliado devido à falta de tempo (por possuírem, por exemplo, jornadas de trabalho excessivas), de formação adequada e falta de apoio dos próprios colegas, da escola e/ou das políticas governamentais vigentes.

            A forma tradicional de ensino de ciências, por meio de aulas teóricas e expositivas, nas quais o aluno é um sujeito passivo no processo de ensino-aprendizagem, mostra-se cada vez mais ineficaz (VALENTE, 1999, DA SILVA, 2011). Esse método engessado de ensino não é exclusivo das ciências e estende-se a outros campos do conhecimento, desde o ensino primário até o final da graduação, em que o aluno não se torna preparado para o mercado de trabalho e/ou para tomada de decisões de maneira crítica (ALMEIDA & RIBEIRO DO AMARAL, 2005). Esta visão vai de encontro ao que é proposto pelo no BNCC-EM (Base Nacional Comum Curricular - Ensino Médio) de 2017 (BRASIL, 2017), em seu artigo 4º, parágrafo 2, que discorre sobre a expressão dos direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento por parte do estudante:

Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas (BRASIL, 2017, p. 4).

            O BNCC-EM traz ainda, especificamente para o ensino de Ciências da Natureza, que o estudante deverá obter as seguintes competências, em seu artigo 14º, línea c:

Analisar, compreender e explicar características, fenômenos e processos relativos ao mundo natural, social e tecnológico (incluindo o digital), como também as relações que se estabelecem entre eles, exercitando a curiosidade para fazer perguntas, buscar respostas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das Ciências da Natureza (BRASIL, 2017, p. 8).

            Reforçado ainda pelo mesmo artigo, línea e:

Construir argumentos com base em dados, evidências e informações confiáveis e negociar e defender ideias e pontos de vista, que respeitem e promovam a consciência socioambiental e o respeito a si próprio e ao outro, acolhendo e valorizando a diversidade de indivíduos e de grupos sociais, sem preconceitos de qualquer natureza (BRASIL, 2017, p. 9).

            A partir da década de 70, percebeu-se a importância da incorporação de noções prévias que os estudantes possuíam anteriores ao ensino formal. Essa apropriação do capital cultural do estudante somado ao processo de ensino-aprendizagem oferecido pela escola é a base do paradigma construtivista, o qual confronta o modelo de aprendizagem por aquisição conceitual, concentrando a atividade de transmissão de conhecimento no professor em detrimento do respeito pelos conhecimentos prévios dos alunos (NARDI & GATTI, 2008). A busca por novas metodologias associados ao perfil construtivista favorece a utilização de um ensino de ciências de caráter prático, como atividades em laboratório, que devem se aproximar e refletir o modo como a ciência é realmente concebida. Desta forma, o presente trabalho enfoca importância entre a parceria universidade-escola como intermédio para aproximação do contexto do “fazer ciência” à realidade dos alunos que cursam o ensino médio.

O ensino por investigação dentro das escolas: a prática laboratorial

            Existe um consenso entre professores de ciências do ensino fundamental e médio que a maior utilização de aulas práticas melhora o ensino de ciências na escola (GALIAZZI et al., 2001). Essa concepção parte dos parâmetros curriculares estabelecidos para que ocorra apropriação do aluno sobre como o conhecimento científico é produzido e de como deve ser aplicado em sua sociedade. Diversas escolas reservam um espaço físico destinado a atividades laboratoriais para o ensino de ciências, no entanto esse espaço é, recorrentemente, sucateado e subutilizado (BEREZUK & INADA, 2010). Contudo, a aplicabilidade desse método apresenta alguns fatores complicadores, como falta de verba para manutenção e aquisição de equipamentos e materiais, a inexistência de atividades prévias para uso do professor e, mais uma vez, a falta de tempo do professor para elaboração dessas aulas.

            Outro fator complicador dentro desse contexto é a questão de formação e preparação dos professores. Embora exista, nos cursos de formação de professores, uma capacitação inicial que direciona a importância e aplicabilidade de aulas práticas no ensino de ciências, não há uma formação continuada desses profissionais que vivenciam o ambiente escolar, os que os torna despreparados e desmotivados para execução de aulas práticas e laboratoriais (ADAMS & TILLOTSON, 1995; CUNHA & KRASILCHIK, 2000). O distanciamento existente entre os profissionais que lançam as diretrizes da educação (geralmente encontram-se na universidade) e dos professores “consumidores”, que aplicam a prática docente cotidianamente, dificulta a formação continuada do professor do ensino fundamental e médio, que não tem um espaço para discutir e apresentar os problemas que emergem a partir do ambiente escolar. Os professores devem se tornar sujeitos de sua prática, colaborando e construindo os saberes que permeiam a utilização dos materiais didáticos, entre eles aulas práticas, em sala de aula (DE OLIVEIRA FISCARELLI, 2007). Nesse sentido, Borges (2002, p. 11) coloca que:

Muitos deles [os professores] até se dispõem a enfrentar isso [contexto laboratorial para aulas práticas], improvisando aulas práticas e demonstrações com materiais caseiros, mas acabam se cansando dessa tarefa inglória, especialmente em vista dos parcos resultados que alcançam. É um equívoco corriqueiro confundir atividades práticas com a necessidade de um ambiente com equipamentos especiais para a realização de trabalhos experimentais, uma vez que podem ser desenvolvidas em qualquer sala de aula, sem a necessidade de instrumentos ou aparelhos sofisticados (Borges, 2002, p. 11).

            Apesar das aulas práticas serem muito enriquecedoras, os professores devem ter muita clareza de que nem sempre a manipulação direta de objetos e equipamentos é suficiente para que o aluno assimile e aproprie do conhecimento apresentado nesse tipo de aula. Por diversas vezes, atividades que possuam linhas de raciocínio e discussão bem delineadas certificam um aprendizado mais concreto do que aulas de experimentação laboratorial, em que o aluno manipula ou opera algo físico. No ensino de ciências, frequentemente depara-se com necessidade de existir material palpável ou demonstrativo, com o qual o aluno deve estabelecer contato. No entanto, por diversas vezes, tal manipulação laboratorial é mascarada pelo professor, que se baseia erroneamente em argumentos construtivistas, para justificar que, o próprio aluno deve executar sua tarefa para construir ativamente seu conhecimento em suas aulas práticas (MILLAR, 1991).

            É evidente que um laboratório bem equipado não garante um ensino de ciências significativo. As atividades práticas devem ser vinculadas ao momento do curso de cada aluno, além de estar adequada à sua realidade e contexto social (BEREZUK & INADA, 2010). As aulas de caráter prático ganham real significado quando os alunos se sentem desafiados e motivados frente às situações que remetam a seu cotidiano, estimulados a buscar referências na literatura e aplicar o que descobriram em discussões críticas, A fim de solucionar o problema proposto pelo experimento laboratorial (BUSATO, 2001).

            Existe uma demanda social na qual o aluno deve compreender e apropriar-se dos produtos da ciência. Tem-se a concepção de que a compreensão e inserção do aluno no mundo científico seriam facilitadas pelas aulas em laboratório (GALIAZZI et al., 2001). No entanto deve existir ponderação ao se estabelecer essa ponte, uma vez que grande parte, se não a maioria dos alunos, nunca teve contato com um laboratório de experimentação, seja por falta de uso de políticas da própria escola, seja pela ausência de um laboratório no espaço escolar (CAMPOS & DA SILVA DINIZ, 2016). Mesmo em países onde há tradição de ensino por uso de aulas práticas, existem muitos questionamentos e discussões acerca de sua eficiência no processo de ensino-aprendizagem (WHITE, 1996). Quando as atividades práticas apenas replicam o que as teorias já explicam, as tornam-se pouco proveitosas e contribuem pouco para construção do conhecimento (VOLANTE ZANON & DE FREITAS, 2007).

            Nas tradicionais aulas práticas de laboratório, os experimentos propostos, em sua grande maioria, visam resultados pré-estabelecidos. Geralmente, os alunos seguem roteiros (por diversas vezes desatualizados) e replicam metodologias ultrapassadas ou que nem mesmo refletem as práticas atuais que são realizadas em laboratórios de pesquisa, o que afasta o aluno da realidade de como a ciência é produzida. O espaço destinado à discussão dos resultados obtidos geralmente é parco ou nem existe, uma vez que no próprio roteiro do aluno já existem respostas pré-determinadas, limitando o poder de observação do aluno - que é uma das atividades mais importantes no campo científico -, tornando-se uma atividade inócua, sem aplicação direta e pouco compreensiva por parte de quem a executa, neste caso, o próprio aluno.

            Para o estudante, deve ficar claro que existe uma diferença entre a ciência realizada por cientistas em seus laboratórios de pesquisa e ciência das aulas práticas realizadas nos laboratórios da escola. Devido à experiência de exercício da ciência, o cientista delineia seus questionamentos, levanta hipóteses, traça seus objetivos, e escolhe os melhores métodos para responder suas perguntas, as quais, muitas das vezes, derivam de uma linha de pesquisa há muitos anos existente. Obviamente, devido a curta duração das aulas e ao enorme volume de conteúdo a ser ministrado, seria inviável replicar exatamente a forma como se exerce a ciência; apesar de que novas metodologias, como por exemplo, o ensino por projetos, vêm ganhando mais força e preenchem essa lacuna na formação do estudante (VIEIRA, 2008; SOARES, 2012).

            Mesmo que as aulas práticas ministradas em laboratórios escolares não reflitam a prática científica em seu cerne, tal fato não deve ser justificativa para a não aplicação de aulas práticas nas escolas, já que tal metodologia pode representar um recorte valoroso do mundo científico para o aprendizado e apropriação da ciência por parte do estudante. Os métodos utilizados, quando cabíveis e dependendo dos objetivos do professor, devem se aproximar o máximo possível do que é realizado nos laboratórios de pesquisa, desde que se dedique tempo para os resultados e discussões dos achados em sala de aula.

 

Parcerias entre a universidade e escola

            Muito se difunde sobre o tripé no qual se sustenta uma universidade federal brasileira: ensino, extensão e pesquisa. Historicamente, grande parte dos centros científicos brasileiros localizam-se nas universidades públicas, que além de oferecer inúmeros cursos de graduação, viabiliza a produção efetiva do conhecimento científico do país por meio de seus programas de pós-graduação (DE ALBUQUERQUE FÁVERO, 2006). Muito se discute, nos últimos anos, sobre o desbalanço entre o tripé de sustentação da universidade, onde ocorreria um favorecimento das atividades de pesquisa em detrimento do ensino e da extensão. Tal desequilíbrio culmina com um afastamento natural das atividades científicas da sociedade que tangencia o mundo acadêmico; quando o desejável seria uma aplicação direta do conhecimento e produção científicos em prol dessa sociedade.

            Nos últimos anos, entretanto, com o aumento da difusão e do acesso à internet e, consequentemente, maior disponibilidade e velocidade de acesso à informação, os pesquisadores tem mudado seu perfil e se aproximam cada vez mais da sociedade. Projetos de pesquisa de extensão têm ganhado espaço dentro das universidades, linhas de pesquisa na área da divulgação científica têm sido estabelecidas e projetos que vão além dos muros da universidade têm se concretizado (CASTRO, 2004; ROCHA et al., 2016).

            Existe um movimento crescente que propõem uma maior interação entre as ideologias que surgem no ambiente acadêmico com a sociedade; e com a ciência isto não é diferente. A universidade tem oferecido maior acesso às suas dependências físicas e criando espaços de aprendizado múltiplos (museus e parques, por exemplo), por meio da oferta de cursos e de parcerias com outras instituições, incluindo escolas de ensino fundamental e médio. Muitos exemplos positivos na área de divulgação da ciência têm surgido no ambiente acadêmico, como os projetos que fazem parte do Núcleo de Divulgação Científica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG): o programa de rádio “Na onda da vida” (https://www.ufmg.br/naondadavida/), o projeto “Universidade das crianças” (http://www.universidadedascriancas.org/), e mais especificamente envolvendo escolas, existe o projeto de robótica entre a Universidade Federal de Lavras e a Escola Municipal Professor José Luiz de Mesquita (MAGALHÃES et al., 2015).

            As parcerias estabelecidas entre a universidade e a escola geram benefícios não somente para ambas as instituições, como para os alunos, professores e funcionários, além de toda a comunidade escolar, que inclui a participação das famílias, por exemplo, (SALES et al., 2014). O envolvimento de diversos sujeitos nesse tipo de parceria promove uma construção de uma consciência científica, de modo que ao se abrir esse espaço, a sociedade perceberá mais facilmente que a ciência é produzida para si própria e, quem sabe, a comunidade até ganhe poder de decisão para estabelecer direcionamentos de algumas pesquisas científicas com aplicabilidade direta em suas vidas. No que concerne à ciência, projetos podem ser propostos para promover uma abertura dos diferentes laboratórios de pesquisa dos institutos federais aos diferentes sujeitos sociais, a fim de aproximar a realidade laboratorial do ambiente escolar.

 

O estudo de caso: Projeto “Curious Minds”

            Em busca de proporcionar a alunos do ensino médio, um contato mais íntimo com o cotidiano de uma universidade, mais especificamente com a rotina de laboratórios de pesquisa, a Professora Doutora Walderez Ornelas Dutra, Professora do Departamento de Morfologia e do Programa de Pós-Graduação em Biologia Celular (PPG-BioCel) do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG propôs o projeto intitulado “Curious Minds” em parceria com a Escola Americana de Belo Horizonte (EABH), Minas Gerais, Brasil. O projeto teve como objetivo trazer alunos (total de 12 estudantes) do último ano da EABH para os laboratórios de pesquisa do ICB-UFMG e apresentar a esses alunos parte do cotidiano laboratorial e de como as pesquisas são desenvolvidas.

            Para realização do projeto os demais professores da PPG-BioCel foram convidados a abrirem as portas de seus laboratórios. Os professores que aceitaram tal proposta, junto a seus alunos de pós-graduação, propuseram uma pergunta e um conjunto de técnicas que respondessem tal pergunta cujas práticas pudessem ser executadas pelos próprios alunos da EABH, mediante supervisão. Os miniprojetos propostos foram em diferentes ramos da biologia celular, e foram intitulados: “Looking at your DNA in different ways” (Visualizando o DNA sobe diferentes perspectivas); “Gene regulation in developmental biology: RNA” (RNA: Regulação gênica em biologia do desenvolvimento); “Structural aspects of the medulla” (Aspectos estruturais da medula); “Gene reporters” (Genes repórteres); “Bloody cells!!”(Células sanguíneas!!) e “Visualizing the cell cytoskeleton” (Visualizando o citoesqueleto). No total, cinco laboratórios do PPG-BioCel, que possuem linhas de pesquisa diferentes, engajaram-se no Curious Minds, revelando a diversidade da pesquisa do instituto.

            O projeto foi configurado para promover quatro encontros. No primeiro encontro os alunos da pós-graduação participantes realizaram uma pequena apresentação (de aproximadamente 10 minutos) para os alunos e professores da EABH sobre os miniprojetos que seriam desenvolvidos nos próximos dois encontros, relacionados com suas linhas de pesquisas. Ao final desse encontro, os alunos da EABH foram divididos em duplas e apresentados aos respectivos membros dos laboratórios nos quais desenvolveriam as atividades; essa divisão foi decidida entre o professor de Biologia da escola e pelos próprios alunos da EABH, baseados em suas afinidades e interesse pelos temas apresentados. Para o segundo e terceiro encontros, os alunos da EABH tiveram duas tardes em que foram encaminhados aos laboratórios participantes e realizaram experimentos previamente propostos. Durante as tardes que os alunos estiveram nos laboratórios, o objetivo não foi apenas replicar metodologias, mas compreender os porquês de se aplicar tal técnica para responder à pergunta inicial.

            Além de estabelecer contato inicial com o cotidiano laboratorial, objetivou-se o desenvolvimento de habilidades requeridas para desempenho da atividade de pesquisa e foram discutidas questões que gerassem noções básicas de biossegurança e do funcionamento dos editais para fomento à pesquisa. Além disso, o método científico norteou todas as atividades, oferecendo base para a posterior interpretação dos resultados obtidos. No quarto encontro os professores e alunos da pós-graduação foram convidados a comparecer à EABH, onde os alunos tiveram tempo para apresentar seus resultados e o que aprenderam nos respectivos laboratórios em que desenvolveram os ensaios. A apresentação dos alunos da EABH foi no formato em os trabalhos são comumente apresentados em congressos, simpósios e seminários científicos, com introdução, objetivo, metodologia e resultados, o que promoveu culminou em desejadas discussões.

            Vale ressaltar que antes do primeiro encontro com os alunos da EABH, os alunos de pós-graduação fizeram reuniões com a Profª. Walderez Dutra para definição dos temas de cada miniprojeto, decisão dos métodos a serem utilizados e para formulação de protocolos que foram disponibilizados aos alunos da EABH nos segundo e terceiro encontros. Um dos principais objetivos da EABH é fornecer uma educação nos moldes de escolas norte-americanas e, consequentemente, os alunos, professores e funcionários se comunicam na língua inglesa. Desse modo, os protocolos, a metodologia no ambiente laboratorial e toda a comunicação entre os alunos da pós-graduação e da EABH foi em inglês. Esse fator foi deveras importante, uma vez que a linguagem oficial na qual a ciência se difunde é por meio da língua inglesa e é previsto que os alunos de pós-graduação estejam familiarizados com a língua para uma maior inserção no mundo científico.

            Como resultado final do projeto, a partir das apresentações dos alunos na EABH no quarto encontro, foi possível notar que apesar dos estudantes terem sido destinados para laboratórios diferentes e terem desempenhado atividades distintas, as noções básicas foram aprendidas, assimiladas e aplicadas por todas as duplas, já que as apresentações evidenciaram que os miniprojetos atingiram os resultados esperados pelos idealizadores. A aquisição do pensamento científico e da habilidade de interpretar e criticar os resultados, assim como de contextualizá-los na disciplina de ciências cursada por eles, dentro do contexto social, foram pontos de grande importância.

            De certo, muitos desses alunos não seguirão carreiras acadêmico-científicas e nem executarão atividades em laboratórios de pesquisa. Contudo, considera-se essa experiência muito válida, já que essa vivência diferenciada subsidiará a compreensão e até mesmo, futuramente, influenciará na tomada de decisões que envolvam questões científicas ás quais eles possam se engajar. Deve-se destacar que um dos alunos da EABH participante do Curious Minds, realizou estágio subsequente no mesmo laboratório de pesquisa da UFMG em que realizou sua atividade, evidenciando a importância do projeto para despertar o interesse pela atividade científica. Além disso, a participação dos alunos traz um elo importante para a divulgação das atividades de pesquisa, uma vez que eles levam as informações a outros alunos da escola e a seus familiares e amigos.

            Do ponto de vista dos alunos da pós-graduação envolvidos, a participação no projeto ampliou sua habilidade de ensino e de orientação referentes às atividades de científicas, em especial para um público que não é muito corriqueiro no ambiente universitário. Esta abordagem tem um papel importante na formação dos pós-graduandos, não apenas como cientistas, mas como educadores. Este projeto deverá ter continuidade para que possamos avaliar, ao longo do tempo, seus benefícios para o ensino de ciências no segundo grau, assim como para os alunos da pós-graduação.

 

Considerações finais

            Faz-se necessário a integração da sociedade no meio científico, afinal os produtos oriundos da ciência devem retornar para o bem e avanço social. Cada vez mais a população se apropria de novas tecnologias, promovendo o avanço de diversas áreas e, com a ciência, não é diferente. Entretanto, nota-se a existência de uma barreira que dificulta a compreensão dos achados científicos e sua apropriação por parte da sociedade. Assim, é muito importante que se criem maneiras eficientes de difundir o conhecimento produzido pela ciência. De fato, a concepção de que a ciência é produzida para os próprios cientistas vem sendo alterada nos últimos anos e projetos que objetivam a divulgação e vulgarização da ciência tem adquirido espaços de destaque dentro das universidades.

            O estabelecimento de parcerias entre as universidades e outras instituições é um excelente canal para divulgação do conhecimento científico. A escola mostra-se como um ótimo possível alvo para essas parcerias, uma vez que trazer os alunos para a realidade do fazer ciência pode contribuir para a conscientização científica tão almejada pela sociedade e que poderá auxiliar nas tomadas de decisão nesse campo. Os benefícios gerados pelo contato direto entre a universidade e a escola não beneficiam somente as instituições, mas sim os estudantes, professores e toda comunidade envolta pelo ambiente escolar.

            Inicialmente é difícil traçar todos os objetivos em um projeto de extensão, sobretudo quando envolve alunos de escola de ensino fundamental e médio já que o aprendizado é tão singular e inerente de cada um. A mensuração dos resultados torna-se muito particular e objetiva e nem sempre podem ser observados de imediato, além de demandarem um acompanhamento a longo prazo. Atividades em que a escola vem até a universidade pode facilitar, a partir do encerramento do projeto de extensão, um maior aproveitamento das aulas de ciências, por exemplo, e fornecer subsídio ao professor que estará mais seguro para abordar os mais diversificados assuntos, contribuindo de formas imensuráveis no processo de ensino-aprendizagem de cada um dos estudantes envolvidos no projeto.

            A criação e reforço dessas parcerias promovem mudanças nos perfis dos alunos de pós-graduação, muitos dos quais se tornarão futuros coordenadores de laboratórios de pesquisa, e que serão, em grande parte, responsáveis pela produção científica ao longo do tempo. É importante que o aluno de pós-graduação tenha contato com as mais diferenciadas atividades possíveis durante seu percurso, desenvolvendo ensino, extensão e pesquisa, para que se tornem profissionais mais completos e preparados para integrarem uma sociedade cada vez mais autônoma, informada e engajada.

 

Agradecimentos

            Os agradecimentos são destinados ao programa de Pós-graduação em Biologia Celular, seus professores, alunos e pelo apoio da coordenadoria para desenvolvimento desse projeto. Agradece-se aos laboratórios participantes do projeto: Laboratório de Biologia das Interações Celulares (representado no projeto pelos Professores Walderez Ornelas Dutra e Rodolfo Cordeiro Giunchetti e seu alunos: Carolina Koh, Teresiama Vellikkakan, Otoni Alves Júnior), Laboratório de Biologia Oral e do Desenvolvimento (representado no projeto pela Professora Erika Cristina Jorge), Laboratório de Biologia Celular e Molecular (representado no projeto pela Professora Luciana de Oliveira Andrade e suas alunas Natália do Couto e Luisa Rezende), Laboratório de Biologia da Neurotransmissão (representado no projeto pela Professora Cristina Guatimosim Fonseca e seus alunos Matheus Proença e Priscila Valadão), Laboratório de Genes Inflamatórios (representado no projeto pelo Professor Aristóbolo Mendes Silva e seus alunos Fernanda Mugge e Felipe Leão). Agradecimento especial à Professora Catarina Song Chen, diretora da EABH, pelo apoio e coordenação da logística de transporte dos alunos da EABH até o ICB-UFMG, ao Professor de Biologia David Ritchie e demais funcionários da Escola Americana de Belo Horizonte que contribuíram para o projeto de diferentes formas.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 31 de agosto de 2020
Publicado em 30 de outubro de 2020


Como citar este artigo (ABNT)

PAULA, Rayan Silva de. NOGUEIRA, Júlia Meireles. COSTA, Alinne do Carmo. COPOLA, Aline Gonçalves Lio. JORGE, Erika Cristina. DUTRA, Walderez Ornelas. “Curious Minds”: Aproximação do Contexto Escolar à Realidade Laboratorial das Universidades. Revista MultiAtual, v. 1, n.6., 30 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.multiatual.com.br/2020/10/curious-minds-aproximacao-do-contexto.html