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Natália Fernandes Kelles
Psicóloga
da Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Psicologia Clínica e
Mestre em Psicologia pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Federal de Minas Gerais. Atualmente servidora do Departamento de
Desenvolvimento de Recursos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais.
nataliakelles@coltec.ufmg.br
Thais Almeida Arantes Villela
Terapeuta Ocupacional pela Universidade
Federal de Minas Gerais. Pós-graduada em Gestão de Pessoas pela Universidade
Cândido Mendes. Atualmente servidora da Universidade Federal de Minas Gerais,
atuando na Divisão de Aposentadoria e Pensão do Departamento de Administração
de Pessoal. thais-villela@dap.ufmg.br
Wellington Marçal de Carvalho
Professor conteudista e orientador de TCC do
Curso de Especialização em Gestão de Instituições Federais de Educação
Superior. Graduado em Biblioteconomia (UFMG) e Doutor em Letras / Literaturas
de língua portuguesa (PUC Minas). Bibliotecário-Documentalista coordenador da
Biblioteca da Escola de Veterinária da UFMG. marcalwellington@yahoo.com.br
RESUMO
O
objetivo do trabalho é realizar um breve resgate histórico da legislação sobre os
programas de educação para aposentadoria no país e uma análise crítica de um
programa de educação para aposentadoria de uma instituição federal de ensino
superior. A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica e a análise
documental da instituição pesquisada. No trabalho, concluiu-se a importância
desses programas e a necessidade de ampliá-los nas instituições de inclusão da
preparação para a aposentadoria desde o início da carreira. Aponta-se ainda a
necessidade de pesquisar os impactos da recente reforma da previdência na
decisão da aposentadoria dos servidores públicos e nas instituições de ensino.
Palavras-chave:
Aposentadora; Servidor público; Educação para aposentadoria.
ABSTRACT
The objective of the work is to carry out a brief historical review of the legislation on retirement education programs in the country and a critical analysis of a retirement education program of a federal higher education institution. The methodology used was the literature review and document analysis of the researched institution. At this paper, it was concluded the importance of these programs and the need of expansion in the institutions and inclusion, from the beginning of the career, of the retirement preparation. It also points out the need to investigate the impacts of pension reform on the decision of public servants’ retirement and educational institutions.
Key-words:
Retirement, Civil servant, Retirement education.
O trabalho apresenta um lugar de destaque na vida
dos sujeitos e está relacionado à atividade produtiva do ser humano. Grande
parte da sociedade passa a maior parte de sua vida adulta no trabalho e, em sua
maioria, convivendo mais tempo com seus colegas de atividades laborais do que
com seus familiares, sendo o trabalho o principal organizador da vida humana.
Figaro (2008) define o mundo do trabalho como
o conjunto de
fatores que engloba e coloca em relação a atividade humana, o meio ambiente em
que se dá a atividade, as prescrições e as normas que regulam tais relações, os
produtos dela advindos, os discursos que são intercambiados nesse processo, as
técnicas e as tecnologias que facilitam e dão base para que a atividade humana
de trabalho se desenvolva, as culturas, as identidades, as subjetividades e as
relações de comunicação constituídas nesse processo dialético e dinâmico de
atividade. Ou seja, é um mundo que passa a existir a partir das relações
que nascem motivadas pelas relações humanas de trabalho, e simultaneamente
conformam e regulam tais atividades. É um microcosmo da sociedade, que embora
tenha especificidade, é capaz de revelá-la. (FIGARO, 2008, p.92).
Dessa forma, o trabalho
modifica e é modificado pelas pessoas em um processo dialético. Para Zanelli,
Silva e Soares (2009, p. 23), o trabalho é um “núcleo definidor do sentido da
existência humana”. As relações interpessoais desenvolvidas naquele espaço
podem contribuir para a saúde ou para o adoecimento mental dos sujeitos. Nesse
sentido, ao se desligar do trabalho, por meio da aposentadoria, muitos sujeitos
podem apresentar sentimentos de inutilidade, tristeza e angústia. Morin (2001)
apresenta uma pesquisa na qual 80% das pessoas, ao serem questionadas sobre o
que fariam em relação ao trabalho se tivessem possibilidade de viver
confortavelmente e financeiramente sem o emprego, relatam que continuariam
trabalhando. Os motivos apresentados foram “para se relacionar com outras
pessoas, para ter o sentimento de vinculação, para ter algo que fazer, para
evitar o tédio e para se ter um objetivo na vida” (MORIN, 2001, p. 9).
Assim, o processo de aposentadoria é complexo e
para alguns sujeitos pode acarretar sofrimento mental. Nesse sentido, é
imprescindível que os sujeitos se preparem para a aposentadoria e construam
projetos de vida que deem novos significados e permitam novos caminhos.
Atualmente, a aposentadoria vem sendo amplamente
discutida devido às propostas de alteração na previdência social, tais
propostas dividem opiniões na sociedade. E essas opiniões muitas vezes são
influenciadas pelos significados que as pessoas dão ao trabalho. Na instituição
federal de ensino em estudo, é possível identificar profissionais que não
pretendiam se aposentar, ainda e apresentam grande potencial produtivo e uma
relação de pertencimento à instituição, optando, porém, pela aposentadoria
devido aos possíveis impactos dessa reforma em sua remuneração. Nesse sentido,
consideramos fundamental refletir sobre a aposentadoria e sobre os programas de
preparação para a aposentadoria ofertados aos servidores. Assim, o objetivo
deste trabalho é realizar uma análise crítica sobre o programa de educação para
aposentaria de uma instituição federal de ensino superior (IFES), perpassando
sobre as legislações referentes a tais programas no país e buscando conhecer as
estratégias utilizadas pelas IFES para auxiliar os servidores no processo de
aposentadoria. Pretende-se também apresentar as implicações, ainda de forma
incipiente, da reforma da previdência na decisão de aposentadoria dos
servidores dessa instituição.
A questão do presente trabalho surgiu da prática
como servidoras técnico-administrativas em educação na Pró-Reitoria de Recursos
Humanos de uma instituição federal de ensino superior. Nesse trabalho é
realizado atendimento aos servidores da instituição para tratar de diversos
assuntos, dentre os quais a aposentadoria. No entanto, percebe-se que muitos
servidores solicitam a aposentadoria com inseguranças e receios sobre o futuro,
enquanto outros manifestam certeza sobre o encerramento do seu trabalho na instituição
e apontam caminhos para seus projetos de vida.
Nesse sentido, é importante criar espaços que
permitam aos servidores refletir sobre seus projetos de vida e qual o melhor
momento para cada sujeito optar pela aposentadoria. Além disso, ações que
promovam o bem estar dos trabalhadores e programas de preparação para a
aposentadoria, seja no âmbito público ou privado, estão previstas no Estatuto do Idoso (Lei nº
10.471/2003) e na Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (Portaria nº
2.528/2006). No âmbito do serviço público federal, foi publicada a Portaria nº
12, de 20 de novembro de 2018, com as diretrizes para a promoção da educação
para a aposentadoria dos servidores. Dessa forma, todas as instituições que
compõem o Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC) devem
promover as devidas adequações a essa normativa.
Na rotina laboral nota-se diariamente que, com as
propostas de mudança na previdência social, para muitos sujeitos essa reflexão
não tem sido possível, visto que o receio de alterações que acarretem em
prejuízos financeiros e/ou aumento no tempo de contribuição tem elevado o
número de solicitações de aposentadorias voluntárias[1]. Em
2018, foram concedidas 269 aposentadorias, sendo a média de 22 concessões por
mês. De janeiro a outubro de 2019, com o novo governo e a proposta de reforma
da previdência, esse número teve um aumento considerável para 313 concessões.
Entre os meses de julho a outubro de 2019, foram abertos ou desarquivados 306
processos de aposentadoria. Acredita-se que as mudanças propostas na reforma da
previdência para o servidor público, aumentando o tempo de contribuição e a
idade para a aposentadoria, sejam o principal motivador desse aumento das
solicitações.
Este
trabalho justifica-se pela determinação legal da implantação de programas de
educação para aposentadoria, conforme apontado anteriormente, bem como devido à
escassez de pesquisas sobre o tema. Além disso,
vislumbra-se a possibilidade de que esse trabalho possa vir a estimular as
instituições a implantarem ações e programas de preparação para a
aposentadoria, a fim de auxiliar os trabalhadores nesse momento tão importante
e decisivo de suas vidas. Como apontado por Pazzim e Marin (2016), apenas 23%
das organizações no Brasil oferecem tais programas. Dessa forma, a divulgação
de iniciativas que tiveram êxito em seus objetivos é fundamental para que o
trabalho seja amplificado.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2. 1 Aposentadoria: reconstruindo
necessidades e desejos
Rodrigues et al. (2005)
apontam que, na sociedade capitalista, a aposentadoria é considerada como perda
do sentido da vida, na qual o sujeito vivencia uma “morte social. Ao se
valorizar apenas aqueles que produzem, deprecia-se o sujeito aposentado”
(RODRIGUES, et al., 2005, p. 542).
Moreira (2011) destaca ainda que, na contemporaneidade, muitos sujeitos “fogem
da vida refugiando-se na vida profissional. O homem que nada mais é do que o
homem do trabalho perde a possibilidade de realizar sua existência: ele apenas
executa tarefas mecanicamente em busca de dinheiro para o consumo desenfreado”
(MOREIRA, 2011, p. 544). Assim, situações de não trabalho, como aposentadoria e
desemprego, podem gerar culpa e vergonha nos sujeitos que vivem no capitalismo,
que exige produção constante. Nesta perspectiva, os sujeitos que não trabalham,
muitas vezes são recriminados e marginalizados. Assim, Zanelli, Silva e Soares
(2009) propõem uma reflexão crítica sobre os significados da aposentadoria em
nossa sociedade, que apontam para inatividade, ócio, não fazer, pôr a parte, de
lado.
Ao discutir sobre os sentidos do trabalho, Moreira (2011) propõe abordar
dois aspectos, sendo o primeiro o trabalho como inscrição psíquica de sentido,
em que o sujeito pode estabelecer com a atividade profissional uma relação que
possibilita realizar sua existência. O outro aspecto é o da sobrevivência, uma
vez que o salário adquirido através da atividade laboral é necessário à
subsistência dos sujeitos. Assim, Moreira (2011), por meio da teoria
psicanalítica, propõe a compreensão do trabalho a partir da dialética
necessidade e desejo “pensando necessidade como o espaço das exigências básicas
de sobrevivência e desejo como uma inscrição humana que revela a face da busca
de reconhecimento pelo outro” (MOREIRA, 2001, p. 545). Dessa forma, ao decidir
sobre a aposentadoria, é imprescindível que os sujeitos tenham reconstruído
suas necessidades e desejos a fim de rearranjar o lugar ocupado pelo trabalho
em suas vidas.
Como destaca Zanelli (2000), o processo de aposentadoria é subjetivo,
por isso, vivenciado de maneira distinta entre os sujeitos. No entanto, a
interrupção das atividades de trabalho desempenhadas ao longo da vida implica
em rompimento de vínculos e mudanças de hábitos que impactam as relações
pessoais e sociais. Assim, o sujeito depara-se com o desafio de “descobrir,
aceitar e assumir novas atividades e novos significados para a vida” (ZANELLI,
2000, p.159). Assim, Zanelli (2000) aponta que os programas de preparação para
aposentadoria configuram-se como programas de desenvolvimento pessoal. A fim de
compreender como esses programas surgiram e como se configuram, apresentaremos
a seguir um breve resgate histórico dos mesmos.
2.2 Breve
histórico dos programas de preparação para a aposentadoria
Pazzim
e Marin (2016) apontam que os programas de preparação para aposentadoria
surgiram na década dos anos 1950 nos Estados Unidos e chegaram ao Brasil a
partir de 1980. Esses programas têm como principal objetivo auxiliar os
sujeitos a realizar a transição para a aposentadoria, promovendo reflexões sobre
o futuro e ajudando a (re) pensar sobre o projeto de vida. A construção desse
projeto é muito importante para que os sujeitos possam transcender o presente e
pensar sobre seus propósitos. Zanelli, Silva e Soares (2009) apontam que o
projeto de vida é um processo de “construção e de elaboração de ideias, que
deve ser continuamente refinado, de modo a transformá-las em estratégias de
ação, sempre levando em conta aspectos referentes à viabilidade e ao valor que
será agregado, tendo em vista a condição futura de aposentado” (ZANELLI; SILVA;
SOARES, 2009, p. 53).
Conforme pesquisado por Pazzim e Marin (2016), na
maioria dos programas a equipe é multidisciplinar e busca trabalhar os aspectos
bipsicossociais da aposentadoria, sendo as principais temáticas: envelhecimento,
relações familiares, finanças, nutrição, qualidade de vida, legislação e
planejamento pós-carreira.
Os programas de educação para a aposentadoria estão
previstos na legislação brasileira. Em 1994, a Lei nº 8.842, que estabeleceu a
política nacional do idoso, já apontava como competência dos órgãos e entidades
públicas na área do trabalho e previdência social “criar e estimular a
manutenção de programas de preparação para aposentadoria nos setores público e
privado com antecedência mínima de dois anos antes do afastamento” (BRASIL,
1994). Essa lei foi regulamentada pelo Decreto Nº 1.948, de 03 de julho de
1996, que apresenta como competência do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), por meio do serviço social e em parceria com órgãos tanto
governamentais quanto não governamentais, o estímulo “a criação e a manutenção
de programas de preparação para aposentadorias, por meio de assessoramento às
entidades de classes, instituições de natureza social, empresas e órgãos
públicos, por intermédio das suas respectivas unidades de recursos humanos”
(BRASIL, 1996).
Os programas de preparação para aposentadoria são
apontados como dever do poder público no Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003),
devendo ser ofertados aos sujeitos com antecedência de, no mínimo, um ano. O
estatuto prevê que seja estimulada a participação dos sujeitos em novos
projetos sociais e fornecidas informações sobre seus direitos sociais. Além
disso, dispõe sobre a necessidade de estimular as organizações privadas a
contratarem idosos, reforçando a ideia de que o trabalho está na centralidade
da vida dos cidadãos.
No âmbito das instituições públicas, em 2018, a
Secretaria de Gestão de Pessoas publicou a Portaria nº 12/2018 que regulamenta
as diretrizes para a promoção da educação para aposentadoria dos servidores
públicos federais. O normativo aponta que tais diretrizes devem ser
desenvolvidas ao longo do exercício profissional e da aposentadoria dos
servidores (BRASIL, 2018). Tal característica indica o caráter preventivo da
preparação da aposentadoria.
A portaria sinaliza a necessidade das instituições
estimularem ações que possam:
I - fortalecer os fatores de
proteção pessoais, psicossociais e organizacionais associados à promoção do
envelhecimento ativo, ao bem-estar e à qualidade de vida antes e durante a
aposentadoria;
II - proporcionar o planejamento
para aposentadoria, a tomada de decisão consciente e voluntária, a transição
segura e a adaptação à aposentadoria com qualidade de vida e bem-estar;
III - estimular o desenvolvimento
de atitudes positivas e que promovam o envelhecimento ativo, a redução do
ageísmo e da discriminação etária; e
IV - valorizar o conhecimento
adquirido pelos servidores com mais experiência profissional e/ou em vias de
aposentadoria e/ou aposentados a fim de preservar a memória institucional
(BRASIL, 2018).
O normativo também apresenta alguns conceitos para
orientar os órgãos, e entre eles destacamos os de aposentadoria, educação para
aposentadoria e memória institucional. A aposentadoria é compreendia como
“término do exercício profissional no serviço público que se caracteriza como
direito da percepção de proventos mensais na fase pós-carreira por já ter
adquirido as condições legais exigidas pelo Estado” (BRASIL, 2018). Ao definir
a educação para aposentadoria, esse momento é considerado como um processo no
qual é necessário planejamento e educação ao longo da carreira, a fim de que a
transição e a adaptação para a aposentadoria sejam bem sucedidas. Assim, o
conceito de educação para aposentadoria é ampliado em relação ao estatuto do
idoso, que previa essa preparação próxima ao momento da aposentadoria, enquanto
que a portaria apresenta a necessidade desse planejamento ocorrer ao longo da
vida dos sujeitos. Tal concepção corrobora os autores que estudam essa temática
e trabalham com esses programas, tais como Zanelli, Silva e Soares (2009).
A memória institucional é conceituada como o
“registro das experiências sobre processos, produtos e serviços vivenciadas
pelos servidores ao longo do seu exercício profissional na instituição, que
podem servir como referência para os que estão na ativa” (BRASIL, 2018). A
portaria também apresenta os fatores de risco e de proteção associados à
adaptação à aposentadoria, e dentre eles destacamos as condições ambientais e organizacionais
que estão diretamente relacionadas ao trabalho desses sujeitos. Assim, o
dispositivo enfatiza a responsabilidade dos órgãos em favorecer condições
adequadas de trabalho para os servidores e a necessidade de auxiliá-los a
estabelecer seus projetos de vida, perpassando sua carreira, a transição para a
aposentadoria e o projeto pós-carreira. Neste sentido, o conceito de memória
institucional pode auxiliar no trabalho com os servidores, intervindo nas
relações intergeracionais, organizando a instituição e estabelecendo as
diretrizes para a gestão do conhecimento e podendo motivar os trabalhadores a
trocar experiências.
A necessidade dos programas de preparação para a
aposentadoria é reiterada pelo Decreto 9.921, de 18 de julho de 2019, que
consolida os atos normativos do Poder Executivo Federal sobre a temática da
pessoa idosa.
A partir do breve resgate histórico e da legislação
sobre o tema, realizou-se uma análise de um programa de preparação para a
aposentadoria, a fim de compreender como as normativas alcançam os servidores,
demonstrando como o programa ocorre na prática de uma IFES.
3
METODOLOGIA
O
artigo é qualitativo e utilizou a pesquisa bibliográfica e documental para
alcançar seus objetivos. A pesquisa bibliográfica, como aponta Quirino (2016,
p. 6), “consiste na procura de referências teóricas publicadas em livros,
artigos, papers etc., para que o
pesquisador que procura explicar um problema a partir das referências
publicadas em tais materiais tome conhecimento e analise as contribuições
científicas ao assunto em questão.”
Após
o levantamento bibliográfico, foi realizada a análise de documentos relativos
ao programa de educação para a aposentadoria e dados dos processos de
aposentadorias dos servidores da IFES pesquisada. Assim, foram consultados
dados quantitativos e qualitativos dos processos, relatórios do programa e
relatórios técnicos das equipes de trabalho que atuam nessa área na
universidade.
Os
dados foram acessados após autorização prévia da área de gestão de pessoas da
instituição. Os dados são internos, no entanto de acordo com a Lei nº
12.527/2011, Lei de Acesso à Informação, esses dados podem ser solicitados por
qualquer cidadão. Em seu artigo 7, a referida Lei, inclui “informação sobre
atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua
política, organização e serviços (...) à implementação, acompanhamento e
resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem
como metas e indicadores propostos” (BRASIL, 2011) como informações que são
asseguradas ao acesso público.
4
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
A
instituição apresentada nesse trabalho possui em seu quadro de funcionários uma
diversidade de cargos, carreiras e contratos de trabalho. Na instituição há
servidores públicos de três carreiras distintas, a saber: docentes de
magistério superior federal, docentes de magistério do ensino básico, técnico e
tecnológico e técnico-administrativos em educação (TAE). Cada uma dessas
carreiras tem regulamentação e atribuições próprias, apresentando, no caso dos
TAE’s, uma diversidade de cargos e, no caso dos docentes, diferentes áreas de
conhecimento. Além desses profissionais, a instituição possui ainda diversos
prestadores de serviço terceirizados, principalmente nas áreas de limpeza,
manutenção e segurança, adolescentes trabalhadores, médicos residentes e
estagiários.
A
instituição apresenta, em seu quadro, servidores que estão ingressando no
trabalho, assim como pessoas que estão na instituição há, aproximadamente, 55
anos. Do quadro atual, de 7.580 servidores, 13% dos docentes e 14% dos TAE’s
estão em estágio probatório, ou seja, ainda não atingiram três anos de trabalho
na instituição. Conforme indicado no Gráfico 1, 10% dos docentes e 12% dos
TAE’s estão recebendo abono permanência, ou seja, cerca de 800 servidores que
já apresentam os requisitos legais para solicitar aposentadoria, mas optaram
por permanecer em atividade. Assim, diversas gerações convivem na instituição.
Gráfico 1 - Dados dos servidores da IFES
Fonte: Fita espelho da instituição
referente ao mês de agosto de 2019
O
programa de educação para a aposentadoria na instituição teve início no ano de
2013 como projeto piloto motivado pela área de gestão de pessoas do órgão,
quando se verificou que, no período de 2013 a 2023, a expectativa era de que
50% do seu quadro de funcionários alcançariam os requisitos para a
aposentadoria. Além disso, os profissionais de recursos humanos da instituição
recebiam servidores buscando orientações sobre a aposentadoria que demonstravam
angústias e dúvidas relacionadas à tomada de decisão. Desde 2014, o programa é
ofertado anualmente aos servidores em dois módulos, sendo um de palestras
informativas e outro de atividades vivenciais. Dessa forma, trata-se de um
programa reconhecido e demandado pela comunidade universitária. O objetivo geral do programa é “estimular a
reflexão e elaboração de um projeto de vida para a aposentadoria por meio de um
conjunto de atividades coordenadas por equipe interdisciplinar” (SILVA;
OLIVEIRA; FERNANDES, 2014, p.10).
Nessa
IFES o programa é denominado Programa de Educação para Aposentadoria (PEA).
Considera-se pertinente a utilização do termo “de educação” na perspectiva do
desenvolvimento e de um processo subjetivo.
A
instituição também busca parcerias com redes de serviços com o objetivo de
divulgar alternativas de lazer, capacitação e saúde, bem como facilitar a
inserção do sujeito em outros grupos sociais, uma vez que o trabalho não
ocupará mais esse lugar. Além de ofertar as atividades e propiciar a reflexão sobre
a aposentadoria e a construção do projeto de vida, o programa, por ser formado
por grupos de servidores, possibilita também a criação de novos laços entre os
sujeitos que, apesar de trabalharem na mesma instituição, muitas vezes não se
conheciam ou não tinham contatos próximos.
Entre
os anos de 2016 e 2018, o programa registrou a participação de 100 servidores,
sendo 12 da carreira do magistério superior e 88 ocupantes de cargos
técnico-administrativos em educação, dos participantes 77 eram do sexo feminino
e 23 do masculino. Observa-se que a adesão dos técnicos é maior que a dos
docentes, assim como das mulheres. Apesar dessa questão não ter sido analisada,
considera-se importante verificar os motivos da maior adesão do programa ser
dos técnicos e das mulheres, uma vez que a legislação prevê o alcance da maior
parte dos servidores. Acredita-se que ao compreender essas motivações seja
possível identificar formas de sensibilização dos docentes e dos homens,
alcançando-se, assim, uma adesão maior desse público ao programa. Dos
servidores que participaram das atividades do programa ao longo dos anos
citados, 43 ainda estão em atividade e 57 já se aposentaram. Verificou-se ainda
que o tempo entre a conclusão do programa e a concessão da aposentadoria foi de,
aproximadamente, dois anos.
Como
citado anteriormente, a Reforma da Previdência, promulgada em 12 de novembro de
2019 como Emenda Constitucional (EC) Nº 103, trouxe alterações relevantes para
o sistema previdenciário brasileiro, sobretudo no que se refere à concessão de
aposentadoria e pensão. Para o servidor que pretende se aposentar com paridade
e proventos integrais e não tenha optado pelo regime de previdência
complementar, instituído pela Lei 12.618/2012, haverá um pedágio correspondente
a 100% do tempo que faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição
estabelecido. Com a EC 103/2019 fica extinta a aposentadoria proporcional que
antes permitia ao servidor, atingida a idade prevista (60 anos para mulheres e
65 anos para homens), optar por se aposentar. Considerando os pontos
levantados, percebe-se a relevância de que o servidor tenha conhecimento e
possa se preparar para sua aposentadoria com toda a antecedência necessária.
A
tramitação da PEC 6/2019, com sua posterior aprovação, que culminou na promulgação
da Emenda Constitucional Nº 103/2019, contribuiu para o aumento da abertura do
número de processos de aposentadoria voluntária, bem como a averbação de tempo
de contribuição, conforme dados já apontados. A Divisão de Aposentadoria e
Pensão da instituição respondeu à cerca de 5.093 mensagens eletrônicas em 2018,
enquanto em 2019[2]
esse número passou para 5.603. Percebeu-se também uma demanda maior por
atendimentos presenciais pelos servidores do setor. Embora o dado não possa ser
quantificado até o momento, sabe-se que foram realizadas 306 convocações para
assinatura do termo de opção de aposentadoria, momento em que são apresentados
ao servidor os fundamentos legais aos quais faz jus, bem como a simulação de
valores de acordo com a norma estabelecida para o cálculo dos proventos.
Conforme
indicado no Gráfico 2, das 269 aposentadorias concedidas no ano de 2018, apenas
26 eram de servidores que participaram do PEA. No ano de 2019, das 313
concessões até o mês de outubro, somente 14 (quatorze) referiam-se a
participantes do programa ofertado pela IFES.
Gráfico 2 - Número de aposentadorias de servidores X número de aposentadorias de servidores que participaram do PEA
Fonte: Dados fornecidos pela IFES
Os
dados de 2019 referem-se ao período de janeiro a outubro.Como o programa
acontece somente uma vez por ano e o número de vagas para o módulo vivencial é
bastante limitado, a instituição deveria investir em outras formas de
conscientização e educação para a aposentadoria, como a publicação de cartilha informativa.
5 CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Conforme
apresentado no trabalho, percebe-se, tanto na literatura quanto nos programas
de educação para a aposentadoria pesquisados, que o planejamento desse momento
da vida dos sujeitos é realizado apenas na iminência da aposentadoria, o que,
muitas vezes, dificulta o processo.
Como
apontado nos estudos sobre a temática, o ideal é que o planejamento da carreira
e o da aposentadoria sejam incluídos no projeto de vida dos sujeitos, a fim de
que eles possam se programar para tal momento de forma consciente, e que as
expectativas e receios possam ser trabalhados ao longo da carreira. Neste
sentido, verifica-se que a questão precisa ser trabalhada nas instituições
brasileiras, uma vez que, culturalmente, elas não se planejam para esse
momento. Além disso, na IFES pesquisada
percebe-se que muitos gestores não preparam sua organização para a
aposentadoria do servidor, que frequentemente desliga-se da instituição e leva
consigo a memória dos processos trabalhos, o que impacta na gestão do
conhecimento.
Dessa
forma, assim como o planejamento da aposentadoria deve estar presente desde o
início da carreira do servidor, é importante que as IFES, em seus planos de
desenvolvimento institucional, também se programem para esse momento, a fim de
realizar a gestão do conhecimento de forma responsável.
Pazzim e Marin (2016) apontam também a recomendação de
pesquisadores sobre a temática da aposentadoria de que seja realizado o
acompanhamento dos participantes dos programas de preparação para a
aposentadoria após a efetivação da mesma entretanto, não se localizou na
literatura estudos que apontem trabalhos de monitoramento dos participantes.
Dessa forma, sugere-se que as IFES também incluam o monitoramento em seus
programas, tanto para auxiliar os sujeitos no processo como também para avaliar
os impactos e ações de melhorias em seus programas.
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[1] As aposentadorias voluntárias
são, como o nome indica, solicitadas pelos próprios servidores. Há ainda a
possibilidade de aposentadoria compulsória e a aposentadoria por invalidez, a
primeira realizada pela instituição quando o servidor atinge a idade de 75 anos
e a segunda quando o servidor possui alguma patologia permanente prevista em
lei que o impede de desempenhar suas atividades laborais.
[2]Os dados
de 2019 referem-se até o dia 31/10/2019. O setor responsável atende demandas de
aposentadorias e pensões.