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Jéssika de Aredes Miranda
Professora da rede estadual de Minas
Gerais. E-mail: jessika_aredes@hotmail.com
Theles de Oliveira Costa
Professor Adjunto da UFMG. E-mail:
thelescosta@ufmg.br
RESUMO
A
gestão democrática da educação pressupõe a existência da participação conjunta
da tríade escola-família-comunidade na definição das propostas pedagógicas, a
fim de estabelecer um ambiente educacional de participação e transparência. Tendo
em vista a efetivação dessa gestão na escola, este trabalho se propôs a analisar
o processo de desenvolvimento e reestruturação do Projeto Político-Pedagógico
(PPP) das instituições de ensino básico da rede estadual de Minas Gerais, com
intuito de identificar e discutir os desafios na elaboração e implementação dos
PPPs na perspectiva de uma gestão participativa, e avaliar se a participação da
comunidade escolar torna a escola um espaço democrático e como esse processo
está sendo efetivado. Para isso, foram consideradas as questões referentes ao
significado de gestão democrática na educação e seu estabelecimento na
Constituição Federal (Brasil, 1988) e nas leis nº 9394/96 e nº 13.005/14,
discutiu-se a construção do PPP sob a ótica dessa gestão e como garantia dela.
Em seguida, foram apresentadas as observações realizadas durante as reuniões de
elaboração do PPP em uma escola específica, na cidade de Governador Valadares.
Nesse processo, constataram-se inúmeras circunstâncias que comprovam as
dificuldades de uma efetiva participação de toda a comunidade escolar no
desenvolvimento do PPP e nas atividades realizadas pela escola, demonstrando
que políticas públicas educacionais comprometidas com objetivos democráticos
devem propor os meios adequados para a sua viabilização, além de levar em conta
os diversos atores envolvidos no cotidiano escolar, pois a gestão democrática
requer a reavaliação da estrutura didática e administrativa da escola atual.
Palavras-chave: Projeto Político-Pedagógico. Gestão
Democrática. Ensino. Educação
ABSTRACT
The
democratic management of education presupposes the existence of the joint
participation of the school-family-community triad in the definition of
pedagogical proposals, in order to establish an educational environment of
participation and transparency. In view of the effectiveness of this management
at school, this paper aimed to analyze the process of development and
restructuring of the Political-Pedagogical Project (PPP) of basic education
institutions of Minas Gerais, in order
to identify and discuss the challenges in the elaboration and implementation of
PPPs from the perspective of participative management, and to evaluate if the
participation of the school community makes the school a democratic space and
how this process is being implemented. For this, we considered the issues
regarding the meaning of democratic management in education and its
establishment in the Federal Constitution (Brazil, 1988) and in laws No.
9394/96 and No. 13.005/14, the construction of the PPP was discussed from the
perspective of this management and as a guarantee of it. Then, the discussions
during the PPP preparation session at a specific school in Governador Valadares
were presented. In this process, it was found several difficulties of effective
participation in the whole school community in the development of PPP and in
the activities performed by the school, demonstrating that educational public
policies committed to democratic goals must propose the means for its
feasibility, besides take into account the various actors involved in daily
school life, as democratic management requires the reevaluation of the didactic
and administrative structure of the current school.
Keywords: Political-Pedagogical Project.
Democratic management. Teaching. Education
1. introdução
O fim do regime militar e
o processo de reestruturação do Brasil abriram o caminho para se pensar em uma
educação de cunho democrático. A Constituição Federal (Brasil, 1988), em seus
artigos 205 e 206, lança as bases para implementação da gestão democrática
educacional, seguindo-se da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) - nº 9394/96 e do Plano Nacional de Educação (PNE) - Lei 13.005/14.
Os princípios do direito
educacional estão listados no artigo 206 da Constituição Federal, repetidos e ampliados no artigo terceiro da Lei nº
9.394/96. O inciso VI, do referido artigo, pode causar alguma confusão, uma vez
que a expressão “gestão democrática” carece de definição e não se trata de uma
norma de eficácia plena, mas que necessita de regulamentação (“na forma da
lei”). O artigo 14 da LDB estabelece que essa gestão ocorrerá, a saber, através
da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto
pedagógico da escola e participação das comunidades escolar e local em
conselhos escolares e equivalentes. O PNE, em seu artigo 9º incumbe aos entes
federados a regulamentação da gestão democrática na escola pública. Esse
princípio, embora não definido e detalhado nesses documentos legais, visa
integrar a sociedade à comunidade escolar (professores, funcionários, pais e
alunos), a fim de melhorar a qualidade do ensino, através de fiscalização da
direção, participação na prestação de contas e colaboração com as escolas.
O objetivo deste trabalho é identificar e discutir os
desafios na elaboração e implementação dos PPPs na perspectiva de uma gestão
participativa. Além disso, procura-se avaliar se a participação da comunidade
escolar torna a escola um espaço democrático e como esse processo está sendo
efetivado.
A
construção de uma gestão democrática e participativa na escola perpassa a
construção do Projeto Político-Pedagógico (PPP), esta ferramenta de
planejamento e avaliação, quando bem utilizada, busca definir a identidade da
instituição, indicar os caminhos para ensinar com qualidade e garantir a
aprendizagem e, por meio dela, o gestor envolve a todos na definição de metas e
ações da escola. Assim, constitui-se uma equipe colaborativa para avaliar os
diferentes aspectos da instituição, o que ela já fez, faz e como é possível
melhorar. Dessa maneira, a administração escolar tem o desafio de garantir que
as ações desenvolvidas na escola não se desprendam da sua atividade-fim, o
processo pedagógico e de evitar o estabelecimento de uma concepção burocrática
de gestão, em que a direção tem função de controle e não há unidade entre as
ações pedagógicas e os agentes.
Este trabalho está fundamentado, principalmente, nas
concepções sobre PPP e gestão democrática de Veiga (1998, 2003, 2009) e
Carvalho (2015) e nas orientações recebidas da Secretaria Estadual de Ensino
para a realização dos itinerários avaliativos no ambiente escolar.
Inicialmente foram apresentados pontos sobre as leis que
estabelecem a democratização da gestão escolar e sua relação com a participação
da comunidade. Depois, discutiu-se como o desenvolvimento do PPP está inserido
nesse processo de ampliação da administração da escola, visto que esse
documento é entendido como de fundamental importância para o estabelecimento de
uma escola democrática e como espaço para práticas de gestão participativa e,
por fim, abordou-se o uso dos itinerários avaliativos, pela rede estadual de
Minas Gerais, como guia na reestruturação dos PPPs das escolas, e sua eficácia
ou não na implementação de uma gestão participativa no contexto escolar, a
partir da observação desse processo em uma escola específica.
2. Referencial teórico
2.1.
Gestão
democrática na educação e projeto político-pedagógico
A gestão democrática está prevista tanto na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB - nº 9394/96) quanto no Plano
Nacional de Educação (PNE - nº 10.172/01), tornando-se imprescindível para a
administração da escola. A LDB
estabelece dois princípios fundamentais e regulamentadores dessa gestão, a
saber: a) Elaboração do Projeto Político-Pedagógico (PPP) pelos profissionais
da educação e b) Existência de conselhos escolares que incluam membros da
comunidade escolar e local. Dessa forma, o PPP é compreendido como importante
instrumento de democratização da educação, uma vez que esse documento ajuda a
construir a identidade escolar e “compreender a cultura da escola e dos seus
processos, bem como articulá-los com as relações sociais mais amplas” (DOURADO,
2006).
A educação escolar é elemento indispensável para o
desenvolvimento da cidadania e garantia da participação de todos, nos espaços
sociais e políticos. O processo acelerado de transformação do mundo através da
globalização proporcionou o desenvolvimento da ciência e tecnologia, e o
estabelecimento de novas estruturas econômicas e de trabalho; como organização
social, a escola é uma das entidades que irá refletir e acompanhar todas essas
mudanças, Russo (2016). Ao comprometer-se com a qualidade da educação – gestão
– e princípios definidos coletivamente – democracia – é vista como um espaço
para a formação de cidadãos responsáveis, conscientes e críticos. Veiga (2003) afirma
que a preocupação fundamental do sistema educativo é a melhoria da qualidade da
educação, uma vez que o educando deve estar apto ao exercício da cidadania e do
trabalho, desenvolvendo-se como pessoa e constituindo-se sujeito social.
Uma concepção ampla de gestão
democrática abrange as dimensões pedagógica, administrativa e financeira,
pressupondo a socialização do poder no ambiente escolar, repensando a estrutura
que rege as decisões/ações administrativo-pedagógicas e garantindo a
participação coletiva e a autonomia da escola, a fim de viabilizar políticas
públicas educacionais criadas pelos próprios sujeitos, sem imposições externas.
Nessa perspectiva, o projeto político-pedagógico é resultado de um engajamento
coletivo, que busca agregar as ações com vista a um propósito comum
desenvolvido pelos diversos protagonistas, que
viabilize a construção de uma prática eficiente (VEIGA, 2003).
O diretor/gestor é a
pessoa responsável por coordenar todo o esforço/trabalho coletivo para atingir
os objetivos da instituição. Entretanto, existem diversas dificuldades para a concretização
de uma gestão participativa: falta de comprometimento dos gestores, falta de
harmonia entre professor e gestor, mudanças de gestores que acarretam
descontinuidade de processos, Carvalho (2015). Fala-se em participação dos
sujeitos, mas não há uma definição clara de comunidade, nem de como seus
membros atuariam.
Ainda persiste nas escolas
a centralização da figura do diretor, além disso, a gestão democrática precisa
de atitude e método, pois o efetivo exercício da democracia requer meios participativos
organizados. Para que a escola estatal seja verdadeiramente pública, é preciso
que haja participação da comunidade escolar interna e externa em todas as
decisões e ações administrativas, Gadotti (2016). Isso requer envolvimento
cotidiano no ambiente escolar, na administração da escola e conhecimento dos
“meandros que
envolvem as políticas públicas em educação e o limite de sua
autoridade/responsabilidade como membros constitutivos desse processo, [pois]
corre-se o risco de que se formem apenas grupos desconexos que somente recebem
e cumprem as decisões de ‘cima para baixo’” (CARVALHO, 2015, p.8).
3. METODOLOGIA
Sob a concepção de gestão democrática este trabalho
tenciona avaliar o desenvolvimento do PPP através dos itinerários avaliativos
propostos pela Secretaria de Educação de Minas Gerais em uma escola estadual na
cidade de Governador Valadares, através do acompanhamento e observação das
reuniões de elaboração desse documento. Tais reuniões ocorreram quinzenal e/ou
mensalmente durante os meses de março e setembro de 2019, os profissionais
envolvidos eram as especialistas (supervisoras), responsáveis pela condução das
reuniões, e os professores.
3.1.
Os Itinerários Avaliativos e a
construção do PPP
Os
itinerários avaliativos reúnem procedimentos com o objetivo de realizar
análises de dados e debates para avaliação interna das escolas estaduais de
educação básica em Minas Gerais. Além de subsidiar a elaboração dos Projetos
Político-Pedagógicos, com vistas à formulação e à efetivação de ações
pedagógicas mais assertivas para melhoria da qualidade da educação e que levem
em conta o contexto de cada escola.
Os
itinerários, Figura 1, distribuem-se conforme as três partes do PPP:
Fonte: Elaborada pela autora,
com base nos
documentos de MINAS GERAIS, 2019 |
São treze itinerários que visam apoiar a escola no
diagnóstico das dimensões que impactam a aprendizagem. Essas dimensões foram
sintetizadas em 4 eixos:
relação da escola com a comunidade,
direito à aprendizagem, gestão democrática e participativa e fortalecimento do trabalho coletivo. O
resultado dessas discussões é usado como base para a definição de ações a serem
implementadas, compondo o plano de ação da escola. A realização desse conjunto
de itinerários pressupõe um papel mais ativo e o fortalecimento do trabalho
coletivo na gestão da escola, os eixos estão sumarizados conforme a Figura 2:
Figura 2: Eixos
Fonte: Elaborada pela autora,
com base nos
documentos de MINAS GERAIS, 2019 |
Cada
itinerário é liberado em determinada data, conforme cronograma da Secretaria
Estadual de Educação e todos os documentos elaborados pela escola são enviados
para o Sistema de Monitoramento, para acompanhamento dos gestores das
Secretarias Regionais de Educação e do órgão central. Os treze itinerários
devem ser realizados em encontros e discussões com os integrantes da unidade
educativa, a fim de construir uma imagem coerente e precisa da realidade
escolar. São diversos questionários que abrangem diversas áreas da escola, a
Figura 3 resume a abordagem de cada um deles:
Figura 3: Itinerários avaliativos
Itinerário 1 - Preparação e orientação para o uso dos
Itinerários Avaliativos: Este
itinerário tem o objetivo de preparar os profissionais para o processo de
implementação dos Itinerários Avaliativos, assim como sensibilizá-los sobre a
importância do planejamento, expressa pela revisão do Projeto
Político-Pedagógico, e da cultura de diagnóstico e melhoria contínua do
ensino e da aprendizagem. |
Itinerário 2 - Revisão do Projeto Político-Pedagógico
da escola: construção do Marco Referencial: Este itinerário orienta o processo
necessário para a reflexão e definição do posicionamento da escola, de modo a
guiar a revisão do Projeto Político-Pedagógico. |
Itinerário 3 - Sujeitos da aprendizagem, contexto
socioeconômico e territórios escolares: Este itinerário tem como objetivo propor o conhecimento
do território no qual o estudante se constitui como sujeito social, de modo a
relacioná-lo com o território escolar e, assim, estabelecendo diálogo entre
as territorialidades sujeito-escola e as aprendizagens. |
Itinerário 4 - Relações interinstitucionais: família,
comunidade e sociedade: Este
itinerário indica a reflexão sobre as relações da escola com a família, os
responsáveis pedagógicos, as instituições da comunidade e da sociedade, de
modo a propor discussões acerca do impacto dessas relações na aprendizagem
dos estudantes. |
Itinerário 5 - Análise de desempenho, rendimento
(fluxo) e frequência dos estudantes: Este itinerário tem o propósito de promover a análise e
a discussão em torno dos resultados das avaliações externas e internas
(diagnóstica e intermediária); estimular a análise e a reflexão coletiva
acerca das competências e habilidades desenvolvidas pelos estudantes, com
base nas matrizes de referência dos componentes curriculares avaliados
externa e internamente e no Currículo de Referência de Minas Gerais; e
possibilitar a análise e o debate sobre indicadores de rendimento (fluxo) e
dados de frequência dos estudantes. |
Itinerário 6 - Diversidade e inclusão na aprendizagem: Este itinerário objetiva subsidiar
o entendimento acerca da correlação entre os temas transversais – educação
das relações étnico-raciais, educação e direitos humanos e educação ambiental
– e os processos educacionais, de modo que as particularidades próprias de
cada tema sejam abordadas e consideradas ao longo de todas as etapas e
modalidades de ensino na composição do currículo, auxiliando na construção
didática e metodológica constituinte do fazer pedagógico da educação básica. |
Itinerário 7 - Impacto da violência nas expectativas de
aprendizagem: Este
itinerário se pauta nas percepções sobre o impacto da violência nas
expectativas de aprendizagem, de modo a incorporar essa discussão ao dia a
dia da escola, tendo em vista ser uma questão comumente relatada por
profissionais da escola. |
Itinerário 8 - Ambiente participativo:
Este itinerário
visa a contribuir para a discussão sobre a participação da comunidade escolar
nas tomadas de decisão da gestão escolar. A intenção é promover um debate
acerca da comunicação e da participação de alunos, professores, colegiados e
conselhos de classe na gestão escolar. |
Itinerário 9 - Participação e formação dos professores: Este itinerário tem por objetivo
promover uma discussão em torno do engajamento e da participação dos
professores e o seu comprometimento com o trabalho coletivo dentro da escola,
assim como o seu impacto para o desenvolvimento da aprendizagem. |
Itinerário 10 -
Síntese do diagnóstico e definição de prioridades: Este itinerário visa a promover a
síntese do resultado das discussões anteriores, com base na sistematização
das questões analisadas e debatidas, de forma que, no momento de sua
execução, sejam formuladas recomendações para o plano de ação, definindo as
prioridades de trabalho a serem elencadas. |
Itinerário 11 - Definição e validação do Plano de Ação:
Este itinerário
apresenta uma metodologia para a definição do Plano de Ação da escola. Indica
os profissionais envolvidos e as linhas gerais das ações a serem
implementadas a partir das deliberações – O que será feito? Por que será
feito? Como será feito? Quando será feito? Quem irá fazer?. |
Itinerário 12 - Detalhamento do Plano de Ação: Este itinerário tem os objetivos de
consolidar as ações propostas e possibilitar que todos os envolvidos tenham
conhecimento das atividades e tarefas que compõem cada uma das ações
desenhadas. |
Itinerário 13 - Monitoramento e avaliação do Plano de
Ação: Este itinerário visa a colaborar com a definição de como ocorrerá o
monitoramento de sua execução, indicando formas de acompanhamento das tarefas
previstas, assim como da sua efetividade. Além disso, detalha os
procedimentos para promover ajustes e correções de rumos no plano de ação ao
longo de sua execução. |
Fonte: Elaborada pela autora, com base nos documentos de MINAS GERAIS, 2019 |
RESULTADOS e discussões
Para elaborar um projeto pedagógico
com efetividade, além de conhecer a fundo o contexto social local, a escola
deve fazer balanços periódicos, que indicarão quais correções devem ser feitas
ao longo do processo de execução/operacionalização. A participação dos diversos
atores envolvidos – professores, gestores, pais de alunos – contribui para o
enriquecimento do debate. Ao refletir sobre sua prática e estabelecer um
objetivo comum, resultado de uma construção coletiva e crítica, a comunidade
escolar conseguirá vislumbrar quais são as suas aspirações, como concretizá-las
e como suprir as lacunas já existentes na realidade atual.
Os
itinerários avaliativos são guias para que a escola possa avaliar, planejar e
agir em direção aos objetivos estabelecidos no PPP, visto que eles presidem a
organização do trabalho educacional. Os
integrantes da unidade educativa vão, então, proceder a uma análise cuidadosa e
criteriosa das peculiaridades/características da escola e das experiências
bem-sucedidas e dificuldades na concretização da aprendizagem, numa perspectiva
alinhada à realidade da escola.
A experiência do processo de
construção do PPP a partir dos itinerários avaliativos, em uma das escolas
estaduais de Governador Valadares, tem se mostrado bastante diversa daquilo que
é proposto, são inúmeras circunstâncias que comprovam as dificuldades de uma
efetiva participação de toda a comunidade escolar no desenvolvimento do PPP e
nas atividades realizadas pela escola. A Figura 4 expõe algumas dessas situações
observadas durante as reuniões, divididas em quatro blocos: atraso, falta de
conhecimento, informações deficientes e falta de participação.
Figura 4:
Observações
Atraso |
Há
atraso na liberação das instruções dos itinerários no próprio sistema, o que
prejudica o cronograma e afeta a presença dos professores, com a alteração
desordenada dos dias previstos para realização das reuniões. |
Falta
de conhecimento |
A
rotatividade de professores, pois em sua maioria não são efetivos, inibe o
desenvolvimento de um projeto que leve em consideração a realidade local da
escola, uma vez que muitos deles estão trabalhando pela primeira vez ali e
não conhecem essa realidade, nem a comunidade e a clientela escolar. |
Informações
deficientes |
Reclamação
generalizada dos professores, a respeito de perguntas que não são da sua
alçada, sobre a comunidade e índices a que ele não tem acesso (como
resultados/estatísticas sobre participação, etc.). |
Em
muitos casos, os professores vão fazer uso de respostas “padrão”, ou
eufemismos, que contenham “aquilo que o governo quer ouvir”, pois na prática,
eles são orientados a não construir uma “imagem ruim” da escola, nem da
comunidade que a circunda. |
Falta
de participação |
Não
há participação dos Assistentes Técnicos de Educação Básica (ATB), Auxiliares
de Serviços de Educação Básica (ASB) e do diretor nas reuniões, mesmo que ela
esteja prevista nas orientações da Secretaria de Educação. |
A participação dos
alunos é restrita às respostas de alguns questionários feitas pelos líderes
de turma. |
Não há participação dos
pais de alunos. |
Durante o sábado
letivo, chamado de Dia do Currículo, em que as escolas estaduais de Minas
Gerais abriram as portas para a comunidade participar com o objetivo de debater
a elaboração do Currículo Referência do Ensino Médio e discutir a reformulação
dos Projetos Político- Pedagógicos (PPP), a participação das famílias foi
irrisória, alguns pais chegaram a assinar a lista de presença e se retirar,
mesmo com a oferta de “atrações” (café da manhã, massagem, apresentação de
dança) pela escola, que visavam garantir maior engajamento. |
Fonte: Elaborada pela autora |
Não há participação da comunidade externa na resolução
dos problemas ou mesmo a tomada de decisão conjunta entre os membros de cada um
dos segmentos escolares – a saber: pais, funcionários, alunos, professores e
gestores. Um exemplo característico dessa realidade pôde ser observado durante
a aplicação do Itinerário 8, em que dos oito espaços de participação e gestão democrática
citados diretamente – Associação de Pais e Mestres; Colegiado Escolar;
Conselhos de Classe; Conselho de Representantes de Turma; Grêmio Estudantil;
Coletivos Juvenis; Assembleia Escolar; Assembleia de Turma –, apenas três
existem na escola, a saber: Assembleia Escolar, para prestação de contas,
Colegiado Escolar e Conselhos de Classe.
4. ConsideraçÕes finais
A
elaboração de um projeto político-pedagógico fruto de uma gestão democrática da
educação requer um ambiente educacional autônomo (capaz de criar soluções
próprias), participativo (tomada conjunta de decisões) e autorregulador
(avaliação contínua de impactos das ações realizadas). Dessa forma, toda a
comunidade escolar toma consciência da importância de sua participação na
defesa dos direitos coletivos e de um sistema educacional mais justo, ao
apropriar-se do ambiente decisório e participar das deliberações do cotidiano
da escola.
Como demonstrado nas observações descritas, a escola não
tem se consolidado como ambiente aberto e um espaço para a comunidade. Se a
melhoria da qualidade educacional está relacionada ao ambiente de atuação
coletiva e à quão ativa essa comunidade é, percebe-se um desarranjo entre a
teoria e a prática.
Muitas vezes, a elaboração do PPP é tida como uma quebra
da rotina, um processo burocrático e não democrático, restrito ao atendimento
das determinações da secretaria de educação, sem mudanças significativas na
cultura escolar. Para os gestores é difícil conseguir participação direta das famílias
dos alunos e os educadores querem manter-se apenas cumprindo suas funções
específicas, o que prejudica o desenvolvimento do trabalho e gera um discurso
esvaziado de ação.
Os mecanismos para uma maior participação existem, mas
não são utilizados de forma eficaz. Como observado, a participação de alunos,
pais e demais funcionários da escola (excetuando-se diretor, professores e
especialistas) não é significativa, e mesmo estes, não participam ativamente de
todas as decisões.
A
democratização da escola e de suas práticas sociais não se efetiva por meio de
leis e decretos, todavia requer que as decisões tomadas nasçam de discussões
coletivas que envolvam todos os segmentos da instituição, pois é preciso que a
escola assuma a postura de uma organização que não inibe a participação de
educadores, funcionários e alunos nos processos decisórios, tendo a preocupação
de analisar os limites e possibilidades dos projetos a serem implantados e
realizando a implementação das propostas na escola – que deixam de existir
apenas na legislação – através de meios adequados, que viabilizem a realização
dos procedimentos democraticamente. Esse processo poderá se completar através
da reavaliação da estrutura didático-administrativa e formulação de políticas
públicas educacionais que considerem os atores envolvidos no cotidiano da
escola, visto que a instituição educativa é regida por indicadores de
desempenho e avaliação de resultados, mas não deve atuar como mera executora de
normas, sem produzir mudanças efetivas nos processos rotineiros.
Referências
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ANEXO A – Pontos de melhoria detectados pelos itinerários avaliativos